Minha mãe analfabeta me ensinou a ler e escrever
No Congresso da União Brasileira de Escritores-UBE, ocorrido em Ribeirão Preto-SP, de 12 a 15 de novembro de 2011, tive a grata oportunidade de assistir uma palestra de Affonso Romano de Sant’Ana (foto) sobre livro e leitura, bibliotecas e afins. Cheguei meio no meio do bate-papo, pois eu estava ouvindo outra palestra sobre a história da UBE, mas consegui acompanhar a explanação de um homem que tem um profundo conhecimento do assunto. Fiquei em silêncio ouvindo e degustando cada frase, cada palavra, cada letra. O Affonso tem um apurado senso de humor e uma excelente memória, além de ter a experiência e dedicação que poucos brasileiros possuem.
Toda a conversa me fez relembrar meus anos de infância e juventude, época em que a literatura entrou em minha vida. Primeiro, através das estórias que minha mãe, Paula Almeida de Jesus, contava para mim e meus irmãos, na hora de dormir. Ao invés de acelerar o processo do sono, aqueles relatos de seres fantásticos, lutas entre dragões e nuvens, raptos de princesas e viagens a outros mundos me faziam viajar, literalmente, numa fantasia que me roubava o descanso da noite. Às vezes eu corria para o quarto dela, com medo dos seres que entravam em meu quarto e se apresentavam vivos e reais.
Da fantasia à realidade e vice-versa o limite não está muito claro na cabeça de uma criança, e aquilo tudo forjou o meu gosto por outras realidades, outros mundos. Após mudar de Jequié para uma fazenda nas imediações de Itagibá, conheci revistas em quadrinhos que lotavam estantes no gabinete da casa da patroa de minha mãe. Como Luci Valverde, a dona da residência, morava, também, em Salvador, e passava temporadas na capital, eu ficava com a biblioteca inteira para mim. Eu entrava por uma janela que tinha defeito e não fechava direito, “roubava” pilhas de revistinhas e levava pra casa, onde devorava em poucos dias. E assim eu li dezenas e dezenas de revistas durante seis anos.
Voltando para Jequié, eu já estava contaminado e viciado pelo gosto pela leitura. Não deu outra e logo procurei onde encontrar livros. A Biblioteca Municipal foi meu refúgio e, ali, eu tomava de empréstimo livros de contos, poesia, literatura infanto-juvenil, jornais etc. A fome de leitura era tanta que, muitas vezes, eu pegava um livro cuja capa me atraía, separava pra levar e logo me decepcionava: já tinha lido aquela obra. Dizem que todo leitor vira escritor. Não sei se isso é previsão ou profecia, mas acabei criando um prêmio literário em 2005, aos 39 anos de idade, cujo objetivo é dar chance a autores novatos, iniciantes na arte da escrita. Desde então já foram mais de mil textos publicados e espalhados pelo mundo todo. Nesse mesmo ano publiquei dois livros de minha autoria e não parei mais de escrever.
Minha mãe, analfabeta de pai e mãe, é quem foi a precursora da literatura em minha família. Após eu aprender a ler e escrever, incentivei pra ela aprender também, o que consegui com muita paciência, ficando orgulhoso quando via ela fazendo o próprio nome e lendo “soletrando” os textos meus e de outros autores. Se a vida não me proporcionar mais nenhuma vitória ou prêmio daqui por diante, já me sinto uma pessoa premiada e feliz por isso.
Ribeirão Preto-SP, 14 de novembro de 2011
No Congresso da União Brasileira de Escritores-UBE, ocorrido em Ribeirão Preto-SP, de 12 a 15 de novembro de 2011, tive a grata oportunidade de assistir uma palestra de Affonso Romano de Sant’Ana (foto) sobre livro e leitura, bibliotecas e afins. Cheguei meio no meio do bate-papo, pois eu estava ouvindo outra palestra sobre a história da UBE, mas consegui acompanhar a explanação de um homem que tem um profundo conhecimento do assunto. Fiquei em silêncio ouvindo e degustando cada frase, cada palavra, cada letra. O Affonso tem um apurado senso de humor e uma excelente memória, além de ter a experiência e dedicação que poucos brasileiros possuem.
Toda a conversa me fez relembrar meus anos de infância e juventude, época em que a literatura entrou em minha vida. Primeiro, através das estórias que minha mãe, Paula Almeida de Jesus, contava para mim e meus irmãos, na hora de dormir. Ao invés de acelerar o processo do sono, aqueles relatos de seres fantásticos, lutas entre dragões e nuvens, raptos de princesas e viagens a outros mundos me faziam viajar, literalmente, numa fantasia que me roubava o descanso da noite. Às vezes eu corria para o quarto dela, com medo dos seres que entravam em meu quarto e se apresentavam vivos e reais.
Da fantasia à realidade e vice-versa o limite não está muito claro na cabeça de uma criança, e aquilo tudo forjou o meu gosto por outras realidades, outros mundos. Após mudar de Jequié para uma fazenda nas imediações de Itagibá, conheci revistas em quadrinhos que lotavam estantes no gabinete da casa da patroa de minha mãe. Como Luci Valverde, a dona da residência, morava, também, em Salvador, e passava temporadas na capital, eu ficava com a biblioteca inteira para mim. Eu entrava por uma janela que tinha defeito e não fechava direito, “roubava” pilhas de revistinhas e levava pra casa, onde devorava em poucos dias. E assim eu li dezenas e dezenas de revistas durante seis anos.
Voltando para Jequié, eu já estava contaminado e viciado pelo gosto pela leitura. Não deu outra e logo procurei onde encontrar livros. A Biblioteca Municipal foi meu refúgio e, ali, eu tomava de empréstimo livros de contos, poesia, literatura infanto-juvenil, jornais etc. A fome de leitura era tanta que, muitas vezes, eu pegava um livro cuja capa me atraía, separava pra levar e logo me decepcionava: já tinha lido aquela obra. Dizem que todo leitor vira escritor. Não sei se isso é previsão ou profecia, mas acabei criando um prêmio literário em 2005, aos 39 anos de idade, cujo objetivo é dar chance a autores novatos, iniciantes na arte da escrita. Desde então já foram mais de mil textos publicados e espalhados pelo mundo todo. Nesse mesmo ano publiquei dois livros de minha autoria e não parei mais de escrever.
Minha mãe, analfabeta de pai e mãe, é quem foi a precursora da literatura em minha família. Após eu aprender a ler e escrever, incentivei pra ela aprender também, o que consegui com muita paciência, ficando orgulhoso quando via ela fazendo o próprio nome e lendo “soletrando” os textos meus e de outros autores. Se a vida não me proporcionar mais nenhuma vitória ou prêmio daqui por diante, já me sinto uma pessoa premiada e feliz por isso.
Ribeirão Preto-SP, 14 de novembro de 2011