"Tirem vinte anos da minha cara"
Parei hoje pela manhã em frente a uma camisaria em Diamantina.Camisaria fina, para as pessoas do mais requintado bom gosto.
Na verdade, o que me levou em seguida a entrar naquela loja, foi a estampa de um jovem, vestido com uma camisa linda, sendo ele belíssimo.
Entrei por curiosidade e para analisar aquelas feições.
Mas aquele era eu! Não tive nenhuma dúvida que aquele rosto era o meu, quando eu tinha vinte e cinco anos!
O cabelo, a boca, o queixo e até a maneira de olhar eram
meus. Nunca ví ninguem tão parecido comigo em toda minha
vida.
Tive uma imensa vontade de chorar o tempo que passou!
O tempo, que é o melhor amigo para o espirito, que nos enche de tesouros espirituais, e nos torna amantes das coisas belas;
Que nos ensina a admirar verdadeiramente, e nos sacia de coisas maravilhosas, com a generosidade dos anos;
Só ele é capaz de forjar os grandes espíritos;
Ele arbitra as nossas alegrias e as nossas dores;
Mas o tempo mortifica o corpo para apurar o espirito. O corpo é a vítima neste processo de purificação!
Deixo o meu retrato na vitrine, quando eu tinha vinte e cinco anos, e vou cuidar das comédias cotidianas para sobreviver na sociedade dos homens!
À noite após o banho ja com o cabelo penteado, me olho no espelho: Apesar da generosidade do espelho e da lâmpada, que me enganam para melhor, eu consigo fazer uma avaliação quase honesta do estado do meu rosto:
"Os cabelos estão no lugar. Perdí muito pouco dos meus cabelos. Mas a cor não me agrada!
Pelo fato muito particular de não gostar de cabelos brancos, e ja ter milhares deles na minha cabeça, eu pinto.
Sem nenhum constragimento eu pinto!
Nunca terão o encanto dos meus cabelos de vinte e cinco anos. Estou remediando. O que fazer senão remediar?
Observo, que a partir do quarenta anos a gente começa a diminuir de dentro para fora, aquilo que convencionaram chamar de perda de matéria óssea.
A pessoa começa a murchar de dentro para fora. O processo é
mais ou menos semelhante ao do maracujá: Olhai o maracujá!
À medida que a pessoa vai ficando com o esqueleto menor, a pele começa a sobrar, e não consegue se acomodar plenamente na camada óssea, dando lugar às rugas.
Observo as minhas sombracelhas levemente baixadas, portanto, diminuindo a abertura e escondendo parte dos olhos, que já não têm o brilho do olhar de outrora.
O nariz continua bem, foi o que menos sofreu, e as orelhas não pude avaliar com clareza.
A boca perdeu grande parte do encanto!
O tempo parece guardar todas as suas dores para a boca.
Pelo fato da palavra, pela graça do sorriso, principalmente
o sorriso, que ilumina a alma e encanta os corações, a boca
tambem parece alimentar todas as nossas amarguras, e fazer
transparecer todos os nossos desencantos acumulados pela vida.
O estado geral ainda me agrada. È uma maneira de sobrevivência que nos concede o espirito. Eu aguento!
A minha fotografia de vinte e cinco anos esta lá, bela e formosa: Tenho momentos de "Dorian Gray"!
Estas crises aparecem de vez em quando , fazem parte da vida de cada um: A nostalgia é universal!
Suportarei as minhas rugas, e as que virão ameaçar o meu espirito, discretamente;
Só não permitirei que estas imperfeições tomem conta da minha alegria, enruguem a minha alma e obscureçam a minha
sensibilidade:
As únicas coisas que temos que colocar sem máculas,
no altar de Deus!