Do cultivo

No início da organização do pensamento humano, quando surgia as perguntas acerca da origem das coisas criadas, houve filósofos que, separando os conceitos pré-concebidos implantados na sociedade daquela época através dos mitos, da racionalização, procuraram saber qual o princípio do qual se originava todas as coisas.

Tales de Mileto afirmou ser a água. Anaxímenes, o ar. Heráclito, o fogo.

Na tradição bíblica foi Deus que, através da sua Palavra tudo criou, e, do seu sopro infundiu a vida. Depois de criada, a terra guardava no segredo do seu interior as sementes das plantas que, com o cultivo do homem passaria a brotar e tornar-se árvores.

Mas o homem ainda não existia.

Da mesma terra Deus modelou o homem. Creio que por isso que as palavras latinas "homo" e "humus" têm certa semelhança, quer dizer, homem e terra (solo). Logo, na Sagrada Escritura, o homem, provindo da terra, retiraria da mesma o seu sustento e, com sua morte, retornaria a ela.

Uma visão esotérico-naturalista vê o gênero humano com uma ligação íntima com as ervas. Charles Darwin e sua teoria da evolução afirma que o ser humano tem como descendente os símios e os arqueólogos comprovam tal teoria comparando os fósseis de alguns milhões de anos atrás com os mais recentes. E, de descendência em descendência chegaria, racionalmente, que todos os seres vivos tiveram suas origens apartir da água. Os cientistas afirmam que a partícula de água é formada por dois átomos de hidrogênio e um de oxigênio. No átomo não há vida. Desculpe-me Demócrito, mas nem na água pura.

A vida é misteriosa.

Assim como o homem e a terra.

Se se não adimitir que a vida provém de Deus, é difícil encontrar outra desculpa.

Depois de tudo isso prefiro dirigir meu pensamento para a terra, nada de metafísico. Detenho-me em discorrer sobre um outro mistério: a agricultura. E, proponho, a mim mesmo, um desafio: há semelhança entre o "homo" e "humus" além de sua etimologia?

No trato com a agricultura e a sexualidade humana a semelhança é erótica, como cantara Milton Nascimento: o cio da terra.

Chega, à roça, o pau-de-arara lotado de peões bóias-frias. Rostos surrados pelo tempo, olhares distantes, mãos e corações calejados carregando enxadas e esperanças e os potes com água como paleativo na luta contra o calor do sol.

"Solis invictus".

A cada golpe de enchada na terra, um afago carinhoso regado com suor e sangue. Ela abre a boca e sorve a seiva do homem trabalhador, e assim, vão preparando-a para o plantio. Remove a terra na esperança-visionária da produção de bons frutos. Vale a pena o cansaço, vale a pena o sangue e ver naquela terra a cor da esperança brotar, misteriosamente, do seu ventre.

Ventre da terra...

Fecundada pelas sementes que a mão do homem pôs.

Abre do chão a cova. Fura e planta a sementinha quase invisível. Engravidar a terra.

Semeá-la.

Não é palavrão dizer "foder", é palavra latina que quer dizer furar. Qual é a imagem que se tem de algo sendo furado? Violado.

Prego na madeira;

dedo no bolo;

agulha na pele;

vidro no pé;

enxada na terra.

Pressão.

Força.

Penetração...

E se lançam as sementes...

Conceber e dar a luz um filho. A terra também engravida e espera a gestação. No seu tempo certo.

Walter Welington
Enviado por Walter Welington em 01/01/2007
Código do texto: T333347
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