Olhos de lince

     Fulano tem "olhos de lince", querendo dizer que ele enxerga tão bem como o formoso gatinho que tem este nome.
     Segundo o dicionário Larousse, para não ir muito longe, o lince "é um mamífero carnívoro, da família dos felídeos, que apresenta patas longas, cauda curta e orelhas terminadas por um tufo de pelos..."
     No seu formidável livro A vida íntima das palavras, Deonísio da Silva informa que a palavra lince, tanto os romanos como os gregos, usavam-na "para designar um felino semelhante à pantera, tido como de olhos muito penetrantes."
     Verifiquei, entretanto, que a origem da expressão "olhos de lince", ou seja, olhos penetrantes como o do tal bichano, não não era aceita pacificamente.
     Em A casa da mãe Joana, Reinaldo Pimenta, parece querer afastar a figura do gatinho.
     Esclarecendo que "com base na palavra grega para lince, lýnks, a mitologia batizou uma das suas figuras com o nome de Linceu (Lynkeus). Que fora "o piloto de uma navio que tinha um olhar tão penetrante que conseguia ver através de nuvens, árvores, rochas, etc."
     Ora, Linceu, figura mitológica grega, em última análise, tinha os olhos do lince, pois, enxergava tudo "em plena treva".
     Fujo, porém, da polêmica sobre a origem exata do dito, para afirmar o seguinte: por ser mais romântico, fico com a tese de que do gatinho selvagem veio a expressão "olhos de lince". 
     
     Perdão! Mas todo esse bolodório foi, apenas, para anunciar o meu triunfante retorno ao meu modesto site, agora enxergando melhor...
     Anunciara, dias atrás, e solenemente (?), que faria uma cirurgia de catarata.  E fiz.  De cristalino novo, lente nova, eis que volto a fazer o que mais gosto, ou seja, escrever. 
     Aos que por mim rezaram - e sei que não foram poucos - agradeço, e lhes digo que a cirurgia foi um sucesso.
     Aos que, por isso ou aquilo, desejaram me ver enxergando cada vez menos, que se lixem; que vão todos pro Inferno.

 
       Foi tudo muuuuuito rápido! Em questão de minutos o jovem cirurgião deu-me vista nova. Quando começava a sentir o enfadonho clima do Centro Cirúrgico, ouvi alguém autorizando meu retorno imediato ao soturno quarto hospitalar, de onde eu viera.
     No quarto, cheguei com fome. Sim, porque observára, com mongil obediência, a dieta pré-operatória que me fora imposta, exigindo de mim, um glutão, estômago de um faquir. 
     Incrível! Estava com apenas 400 ml de água de coco na bexiga, sorvida com desenvoltura durante a madrugada, mais de dez horas antes da operação. Veio um frugal lanche, que "sumiu" em questão de segundos!
     
      Conta o Evangelista João, também chamado de O Teólogo, que Jesus de Nazaré curara um cego, nos caminhos da Palestina - Cp 9 e versículos. E que para fazê-lo enxergar, usara Sua saliva.
     Deitado numa cama, e vendo descer, em lentas e torturantes gotas, o soro para, através de minha veia, alimentar meu corpo fragilizado, lembrei-me dessa tocante passagem bíblica.
     
   
      O milagre narrado por João teria causado o maior rebu, posto que, praticado num sábado, para os judeus, um dia sagrado.
     Mas para o Mestre, o importante era que o homem  voltasse a ver o que de belo ELE havia criado: o céu, as estrelas, o sol, a lua, o mar, os animais, as flores e, principalmente, o sorriso do próximo mais próximo.
     Com este pensamento tomando conta de minha cuca, deixei o hospital; sem sentir saudades, mas com  "olhos de lince"...  Ah, sim, e vendo no meu médico o Cristo de jaleco verde!

     
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 11/11/2011
Reeditado em 24/08/2013
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