NEM O TRAFICANTE, NEM O POLICIAL...

NEM O TRAFICANTE NEM O POLICIAL.*

Danilos

“Nem o traficante nem o policial tem culpa, a culpa é daqueles que tem o patrimônio incompatível com a renda” disse o Dantas dentro do bar do “Paraná” ao termino de uma reportagem pela televisão em que uma criança foi baleada por acaso quando ocorria um confronto entre policia e traficantes. As pessoas em volta o olharam com expressão de indagação, ninguém entendeu a colocação. O Dantas que esperava essa reação então concluiu. “Tudo que acontece no país é culpa dos bandidos de Brasilia”. Era sábado calorento, já pela tarde, alguns já tinham bebido mais do que deviam e o comentário foi o estopim para um acalorado debate. De cara um sujeito contrariou afirmando que a culpa era da policia que deveria “sentar o dedo” na bandidagem, mas não chegou a completar e outro cidadão defendeu os bandidos alegando que são vitimas da ausência do Estado. Dessa colocação em diante ficou difícil alguém se entender pois ninguém ouvia e as opiniões se sobrepunham. Um sujeito que não conheço bem, demonstrava satisfação com o desentendimento e enquanto colocava cerveja no copo falava alto que a culpa é dos deputados mesmo, porque eles que fazem as leis. Outro que tem um irmão na policia tentava passar a todos o drama dos policiais, falava do baixo salário, do alto risco, da falta de apoio da sociedade e das instituições. O Dantas para quem não conhece aparenta um desclassificado, um vagabundo, anda sujo, mal arrumado e passa a maior parte do tempo bebendo. Dizem alguns que já foi pessoa importante, caiu na vida, se desiludiu por traições sofridas e virou aquela figura. Da minha mesa, observava tudo e minha atenção maior era para o semblante do Dantas, demonstrava que tudo se desenrolava conforme sua previsão. Ouvi coisas sensatas, na mesma quantidade que escutei asneiras mas no total foi interessante, sobrou muito material para crônicas. Quando os ânimos se acalmaram o Dantas fechou o assunto que tinha começado dando a opinião que estava contida na sua observação inicial. Afastou-se um pouco, saiu da roda e em pose de palestrante falou que cria abelhas e que se por acaso a rainha morre ou é retirada, imediatamente outra é desenvolvida ou criada, não sei o termo correto. Concluiu que não há meios de uma colméia ficar sem rainha, e que a única forma disso ser possível é a não existência de abelhas. Vi mais uma vez o Dantas conseguir o resultado esperado, as pessoas se calaram, lhe deram atenção e fizeram a pergunta que ele queria. Então explicou que o “pessoal do patrimônio incompatível com a renda” liberou as drogas não penalizando o usuário e que quando criaram esse conceito criaram a colméia. Ouvi isso e não dei mais atenção para a conversa pois minhas lembranças foram remexidas com aquela comparação, lembrei me de um traficante que deu trabalho para a policia de Jarinu, era terrível, foi preso e criou abstinência no mercado de drogas, e então alguém teve a idéia de ir buscar drogas em Morato mas trouxe um pouco a mais para alguns amigos, mas muitos queriam, dava lucro e assim nasceu o novo traficante, durou pouco, foi preso, e eis que o mercado clamou por fornecedores sendo logo atendido. Mais algum tempo e novo traficante preso e esse meu amigo, um aposentado, pai e avô, morreu na cadeia. Ser usuário pode, atender o usuário não pode, essa é a lei. Então dei razão ao Dantas que alegou que o único jeito de não existir abelha rainha é não existindo abelhas. Por essa lógica não existindo usuário não existe traficante enquanto a lógica oficial entende que se não houver traficante não existe usuario. Fui embora até um sitio mais na frente, na volta vi alguns dos debatedores caminhando pela pista e percebi neles uma pequena satisfação, a satisfação de ter lutado armado de argumentos em defesa de nossa sofrida Pátria.

danilos
Enviado por danilos em 11/11/2011
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