Mulhé macho sim sinhô
Estaca-se na minha frente, na calçada fervilhante de transeuntes, com jeito de surpresa:
_ Lembra-se desta moça, Seu Carlim?
Não me lembro. Faço um esforço danado e nem assim consigo. Apenas o rosto da senhora de meia idade que me dirige a palavra parece-me vagamente familiar. Resolve tirar-me do embaraço:
_ É Ritinha, seu Carlim. Quando Zé Vieira trabalhou com o sinhô ela era coisinha assim.
É como se uma luz se acendesse. È uma família migrada da Paraíba, Zé Vieira, meio moleirão, trabalhou comigo alguns dias, mas bebia muito e faltava ao trabalho. Não conseguimos mantê-lo no emprego, mas assistimos à família durante algum tempo. Minha interlocutora, de quem nem me lembro o nome, demonstra viva gratidão. Lembro-me da paraibana muito magra e despenteada, com duas filhas pequeninas e o marido embriagado. Está agora vistosa, bem nutrida e vestida decentemente, não obstante a simpliscidade.
_ É claro! A Ritinha. Como cresceu! E está muito bonita também.
Ela sorri orgulhosa:
_ Está com quinze anos, Seu Carlim. A outra, a Angélica, já completou dezessete.
_ Que bom! Já está com a família criada. E o Zé Vieira? Como está ele.
_ Ah! Seu Carlim. Consertou. Não bebe mais. Não perde mais um dia de serviço. É bom com as meninas e comigo. Um doce, Seu Carlim.
_ O que aconteceu?
_ Olha, moço, eu já tava cansada daquela vida, num sabe? Um dia ele chegou bêbo, aproveitei o pau envergado e dei nele uma tunda de cabo de vassoura que ele ficou uma semana de cama - Dá uma risada _ e eu banhando ele com água de sal.
Rio também, um riso genuino. Lembro-me imediatamente da canção do Gonzagão: "paraíba masculina mulhé macho sim sinhô".
_ Aí ele mudou de uma vez?
_ Que nada Seu Carlim. Vez em quando ele tinha uma recaída, aí eu le dava outra surra. Foi indo aé entrar no eixo.
Dá outra risada. Aperta calorosamente a minha mão e segue pela calçada abraçada à filha.