Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Itatupã-Baquiá: Modalidade Pioneira de Regularização Fundiária em Gurupá

Agosto de 2005

E tudo começou com uma discussão sobre plano de uso dos recursos naturais. A comunidade do São João do Jaburu, em Gurupá, preocupada com o futuro de seus habitantes que vivem do extrativismo do açaí, da pesca, da caça e da extração de madeira, iniciou uma revolução silenciosa de reorientação de como usufruir a floresta que a cerca, seus rios, suas plantações. Um verdadeiro código de postura que proporcionou aos moradores locais e de comunidades vizinhas debater temas ambientais cruciais que, enfim, levaram aos questionamentos sobre a situação fundiária em que viviam.

A partir da constatação de que empresas madeireiras que se diziam donas daquelas terras, de fato não detinham documentos comprobatórios de legitima posse, as comunidades da região do Itatupã-Baquiá prepararam - com o apoio de entidades como FASE, Sindicato de Trabalhadores Rurais de Gurupá, Câmara de Vereadores, ProVárzea e Conservação Internacional - o pedido de criação de uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) primeiramente a nível municipal. Tal estratégia foi repensada e direcionada para a esfera federal, uma vez que as famílias envolvidas estavam temerosas em relação às práticas politiqueiras ainda correntes no país. Assim, optou-se pela segurança, apesar de mais dificultosa, do reconhecimento por parte do Governo Federal.

A área decretada pelo Presidente Luis Inácio Lula da Silva, assinada em 14 de Junho de 2005, possui 64.753 ha, envolvendo 142 famílias (cerca de 800 habitantes). Trata-se da primeira reserva do gênero implantada no país, apesar de estar prevista na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. A principal característica de uma RDS é o uso responsável do meio ambiente, com a gestão dos recursos naturais da fauna e da flora conduzidas pela população local e IBAMA.

Os próximos passos após a criação da RDS de Gurupá são o cadastramento dos posseiros, a realização dos estudos biológicos e a ampliação do número de planos de uso comunitários, ferramentas que serão fundamentais na elaboração do Plano de Manejo da RDS. As atividades até o momento desenvolvidas que apontam para a sustentabilidade de ações no Itatupã-Baquiá são:

 Os planos de manejo florestais madeireiros de pequena escala (PMF familiar) aprovados no IBAMA;

 O manejo de açaizais nativos diminuindo a exploração desordenada de palmito;

 O aproveitamento de capoeiras para fins agroflorestais – manejo de pau-mulato;

 O uso múltiplo de andiroba, com plano de manejo em tramitação no IBAMA-Ap e liderado pelas mulheres da região;

 O manejo sustentável do camarão como forma otimizada de utilização desse recurso pesqueiro;

 O fortalecimento institucional de associações comunitárias locais como a APROJA, ATAEDI e ATRAEIB .

Nas circunvizinhanças da RDS, existe um movimento de habitantes que também está trabalhando uma proposta de reserva, desta vez, extrativista (RESEX). O objetivo é, portanto, formar um mosaico de modalidades de unidades de conservação, somadas aos projetos já existentes em Gurupá, como os de Assentamento Agroextrativista em áreas de várzea – com a parceria entre GRPU e INCRA, Cessão de Uso Gratuito, Assentamento Estadual Agroextrativista, Remanescentes de Quilombos e titulação individuais, estes três últimos de alçada do ITERPA. Além disso, já tramita no Conselho Nacional de Populações Tradicionais do IBAMA uma proposta de RESEX que abrange os rios Marajoí e Pucuruí.

Um conselho para as comunidades amazônicas desejosas do direito de viverem em uma RDS, Reserva Extrativista ou outra categoria de regularização fundiária: comecem a discutir o modo como encaram a natureza. No mínimo estarão ajudando seus filhos e netos a permanecerem em seus lugares de origem. Documentos de terra em favor das comunidades tradicionais? Depende do grau de organização em que estiverem.