Passou o Dia dos Mortos

 
       “Assim passou o Dia dos Mortos”, murmurou o taxista que já tinha feito muitas idas e vindas dos bairros ao cemitério. Disse esperar, durante ao ano, aquele dia tão rendoso de corridas e que passava tão rápido: - “Cada dia mais, ninguém quer vir de carro. Não tem onde estacionar. Geralmente as viúvas são idosas e não suportam caminhar a pé, da Maciel Pinheiro ao túmulo do marido ou de algum neto, vítima em acidente de trânsito”.  E para findar o assunto, ao cobrar-me a corrida, concluiu: “Enfim, na vida tudo passa”. Foi quando me veio a lembrança de uma velha canção, cantada por Miltinho: “Ninguém é de ninguém”. Os vivos cuidam do Dia dos Mortos, movimentam-se aonde foram sepultados seus entes queridos, levam-lhes flores, pagam aos zeladores dos túmulos e motivam, na frente e nos arredores daquele sossegado lugar, um “mercado persa”. Lá tudo se compra, de flores a variadas comidas.
       
       Algumas culturas preparam comidas especiais para essa data, inclusive, colocando a denominação do dia nos pães e doces, como no México dos costumes nativos e vindos da católica Espanha que celebra assim o dia dos mortos.  As padarias separam o trigo para os tradicionais pães e bolos, muitos deles com símbolos e referências aos mortos. Não somente de trigo, mas também especiais iguarias de milho; frutas; sementes; “calaveritas de azúcar”; estatuetas;  incensos e até mesmo o famoso “pan de muerto”.  Assim também se comportam outras cidades deste mundo, celebrando essa festa... Festa, não! Melhor chamá-la de Dia de Finados, a exemplo dos dias consagrados a todos os santos e, entre os vivos, ao do professor, aos pais e às mães.  Ora, pouco se reflete sobre a morte, preparando-se para ela. Neste sentido, o assunto merece pelo menos um dia de atenção e também de dedicação a quem já passou por essa fatídica e inevitável circunstância. Certeza lapidar, apenas relembrada nos velórios, no momento do discurso fúnebre ao lado do defunto ou aos ouvidos dos que choram, ao som de cochicho, a título de reconforto.  Seria mais adequado que os próprios mortos falassem da morte.  Quem mais do que eles vivenciou tanto essa experiência?

   Dias de Finados não mais existe aos que se entregaram ao comodismo dos dias de hoje.   Acham se tratar apenas de um feriado e que bem merecem um pouco do descanso dos que eternamente já descansam. Alegam que as ruas não tem mais segurança, principalmente as ruelas esquisitas e maltratadas dos cemitérios e assim esquecem a então costumeira visita à última morada. Razão maior Jesus Cristo deu a um dos seguidores, diante da prioridade de pregar a Boa Nova, quando um deles justificou que, antes de se doar à pregação, deveria sepultar um dos seus falecido.  Jesus o admoestou com enigmáticas palavras: “Que os mortos enterrem seus mortos”.