AFINANDO A VIDA, por finados.
Por Carlos Sena
Todo mundo quer ir pro céu, mas ninguém quer morrer. Mas a morte é a única certeza que a gente tem desde o dia em que nascemos. Contudo, há quem se imagine imortal ou se deixe levar pelas benesses do consumo e da modernidade, como se isto atenuasse o fim de todos. O pior é que desde que o homem é homem na face da terra que ele morre e, portanto, não há nenhum caso na história que demonstre ele ter ficado pra semente, ou num vidrinho com álcool para a imortalidade.
O sentido da vida, certamente, que é maior do que o da morte e é isto que nos conforta. Sabendo que a morte é certa, a gente não se desespera e continua amando a vida como se eterna fosse. Talvez até mesmo seja eterna, dependendo dos prismas que a gente, filosoficamente se imponha acerca do amor, do tempo e da vida transitória ou não. Diante disto, ficamos um pouco sem entender a razão do egoísmo, do preconceito e das vaidades humanas tão crescentes e tão maculadoras da nossa espécie. Em vinte séculos, talvez pudéssemos compreender que o foram de solidão. Solidão de princípios, de ética, de amor, de empatia. Solidão de saberes, posto que os reais saberes tem que ser compartilhados, senão não se prestam pra nada. Em pleno terceiro milênio a gente claudica entre os bens de consumo e demais benesses que a modernidade nos permite. Entre eles, a gente pouco se conta na evolução interior que seja capaz de nos fazer perdoar e amar, como nos recomenda Jesus Cristo. A lei do “olho por olho e dente por dente” parece que se modificou apenas da estrutura, mas na substância continuamos bem ao modo moderno, agindo na modalidade “olho por olho e dente por dente”, disfarçadamente...
Como tudo que começa finda, a vida em si mesma se exaure e se vai. Ou se transforma, se quisermos ser otimistas, independente da fé que professemos. A eternidade é o prêmio que inventamos (ou não) como forma de consolo, senão talvez a vida ficasse pesada demais. Nisto a gente constrói a ilusão da eternidade e dele se alimenta como se não existisse amanhã. Ou como se o amanhã existindo não nos subtraísse a capacidade de sermos eternos em nossa finitude.
Um dia a gente tem que finar com a vida. Aos finados a gente leva flores, pois como disse o poeta: “as flores são uma questão de sorte. Umas enfeitam a vida, outras enfeitam a morte”. O finar da vida não é como o trinar dos pássaros. Estes trinam sem ser finados, nós só afinados com o amor retornaremos ao reino das ilusões que cada um elegeu como forma de céu. Há quem só tenha, após a morte, o céu da boca por compaixão. Há, certamente, aqueles que terão no fim, o começo de novas missões como que se redimindo do amor nunca concluído, nem dos perdões efetuados. Ademais é a vida em seu curso normal, enquanto o sopro final não nos conduza de desafinados a finados. Afinar a vida é a única alternativa de não temermos o dia do GRAN FINALE.