Ruas de uma cidade sem gente

Deparei-me em um lugar inóspito. Andava por uma rua vazia, deserta. Ouvia murmúrios, risadas. Olhava ao redor, mas não havia nada. Apenas relances, reflexos de alguém num lugar errado.

Andava eu por aquela rua sem fim, talvez até sem começo. Tentava, mas não compreendia o porquê de eu estar ali.

Tudo parecia estar ofuscado. O sol não brilhava como o normal. O vento que ali soprava congelava até a alma dos mais indecisos.

Dobrei a esquina, seguindo outro caminho. Nesse havia pessoas. A maioria delas me encarava sisuda, como se eu fosse culpado por algo em suas vidas. Andando por entre o asfalto já velho, o chão sujo, tomado de lixo, encontrei gente pedindo esmolas. Mais à frente, um grupo de jovens pichava a parede de uma casa, enquanto outros brigavam por motivos não-aparentes. Próximo a uma esquina, um menino arrancava a bolsa de uma mulher e saía em disparada. Ela gritava por socorro, mas parece que apenas eu a ouvia. Percebi que os policiais eram pessoas que carregavam farda, arma e uma cara fechada, prendiam os inocentes e dizimavam os desfavorecidos. Os carros buzinavam freneticamente, motoristas ficavam enfurecidos e os pedestres atravessavam no meio da pista. A população andava rápida e cabisbaixa pela calçada. Os poucos que falavam algo apenas repetiam o que lhes foi dito. Outros, na tentativa de fugir daquele mundo surreal, sujeitavam-se à mediocridade que o sistema lhe impunha. Eram meros imitadores de um “ideal” elitista.

Tudo era tão estranho. Todos pareciam máquinas. E eu, por mais que não quisesse, estava tornando-me uma delas. A convivência, mesmo que rápida, estava me transformando. Entretanto, algo me impressionava ainda mais: parecia já ter estado naquele lugar antes. Onde estou?!

Estava perplexo. Procurei meu relógio para ter uma noção de tempo, mas não o encontrei. No entanto, percebi que as vitrines das lojas possuíam relógios enormes e que todas as pessoas os carregavam no pulso. Pareciam até ser extremos dependentes do tempo. Conferi que já era quase meio-dia. Dirigi-me a um restaurante em busca de alimento.

Entrei em um. Todas as pessoas comiam com pressa. As crianças e os adultos deliciavam-se com uma comida estranha, a qual fui obrigado a ingerir porque, afinal, parecia ser a única existente.

Tempo depois, já estava na rua novamente. Estagnei no meio da calçada admirando com fascínio a correria daquela gente, eram como um enxame de abelhas em busca do mais precioso néctar. De repente, alguém trombou em mim. Olhei para trás e uma grave voz sussurrou:

- Saia da frente! Se não quer andar, dê lugar para que passemos.

Nossa! Eu estava realmente acordado.

Subitamente liberei a passagem.

Percebi que poucos sobreviveriam àquelas circunstâncias e que a adaptação para aquela realidade seria algo inevitável.

No entanto, era hora de prosseguir. Precisei enfrentar o que estava escancarado à frente de meus olhos, um lugar no qual apenas no mais sublime devaneio poderia imaginar. Pela primeira vez queria estar em um pesadelo e livre das angústias do mundo real.

Douglas Moraes
Enviado por Douglas Moraes em 30/10/2011
Código do texto: T3307341
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