O Tamarindo de Augusto
(De autoria do escritor Napoleão Valadares, publicada no Livro - Passagens da Minha Aldeia, Editora Kelps, Goiânia - Goiás, 2007. Napoleão Valadares é membro de várias instituições de cultura, advogado da AGU - Advocacia Geral da União, romancista, contista, cronista e poeta. nasceu em Arinos (MG) e vive em Brasília - DF.)
A juventude é meio encantada com a obra de Augusto dos Anjos. Talvez pelo tom de revolta que aparece em seus versos e que é próprio também dos anos juvenis. Por isso, costumamos, desde cedo, ler e decorar os sonetos de Eu, e Outras Poesias. E aí encontramos o tamarindo do Engenho Pau d'Arco, no município de Cruz do Espírito Santo, onde o poeta nasceu. O tamarindo aparece em "Vozes da Morte", em "Queixas Noturnas" e em "Debaixo do Tamarindo".
No fim do ano passado, Saulo Lucena foi passar férias na Paraíba e resolveu conhecer o Engenho Pau d'Arco, constatando que lá ainda se encontra o centenário tamarindo. Trouxe-me uma fruta dele, de que retirei sementes e as plantei, combinando com Saulo que levaríamos uma muda para o cemitério de Leopoldina, onde Augusto dos Anjos está sepultado.
Uma das sementes germinou. Nasceu e cresceu uma bonita plantinha. Parece que ele sabia, quando escreveu: "Não morrerão, porém, tuas sementes! / E assim, para o Futuro, em diferentes / Florestas, vales selvas, glebas, trilhos".
Cuidei, então, em organizar um grupo de pessoas ligadas, de alguma forma, a Augusto dos Anjos, para levar a Leopoldina, a muda nascida duma semente do tamarindo do Engenho Pau d'Arco. Seríamos Anderson Braga Horta e José Jeronymo Rivera, que estudaram em Leopoldina; Jorge Odilon dos Anjos, sobrinho do poeta; Saulo Lucena, que trouxe a fruta; Ronaldo Cagiano, que saía de Cataguases e ia a Leopoldina de bicicleta tirar fotografias do túmulo de Augusto; William Valadares, meu primo, que também tirou para mim fotografias do túmulo; e eu.
Imaginávamos que tudo deveria acontecer no dia 20 de abril, aniversário de nascimento de Augusto dos Anjos, mas teríamos que combinar com o prefeito de Leopoldina. E tratei de fazer contato para acertar tudo, planejar a viagem e prestar a homenagem ao poeta. Era uma lembrança para "aquele que ficou sozinho / Cantando sobre os ossos do caminho".
Mas quando telefonei para a prefeitura, fui informado de que no ano passado, precisamente a 20 de abril de 2002, o Governo do Estado da Paraíba, com uma comitiva composta por treze representantes de instiutições culturais, havia plantado uma muda de tamarindo à beira do túmulo de Augusto dos Anjos.
(Em julho de 2010, viajei de Belo Horizonte até Leopoldina (MG), perto de Juiz de Fora, só para visitar e tirar fotos do túmulo de Augusto, um dos poetas brasileiros mais admirados e, por certo o mais original. Quando estive lá, a muda de tamarindo citada na crônica já estava dando sombra. E à beira do túmulo havia uma placa com os seguintes versos do poema Debaixo do Tamarindo:
Quando pararem todos os relógios
De minha vida, e a voz dos necrológios
Gritar nos noticiários que eu morri,
Voltando à pátria da homogeneidade,
Abraçada com a própria Eternidade
A minha sombra há de ficar aqui!)
Onofre Ferreira do Prado