Do caroço das coisas
Crônica publicada no Jornal Agora/Mulher Interativa - Out/2011
Já diz o jargão “Nem tudo o que reluz é ouro” – na verdade, raramente é... Primeiro, porque muitas coisas podem se fazer passar por ouro, vindo a enganar de espertos a tolos. Segundo, porque a mente prega peças – especialmente quando carregada de ânsias e ganâncias.
E, além disso, vale lembrar que o valor atribuído a todas as coisas está no consenso dos olhos que a avaliam, e não na coisa em si. Em outros tempos, sementes eram as maiores riquezas que se podia levar nos bolsos. E o ouro, não passava de um pedaço de pedra brilhante e hipnótica, cuja beleza, aparentemente inofensiva, viria mais tarde a cegar milhares de homens, acabando por opalescer-se sob abundantes e irregulares manchas rubras – embora o consenso dos olhos ainda veja nele mais valor que em qualquer semente, independente do que germine.
Assim como são as coisas, são as criaturas: raramente o valor de uma é mesurado por aquilo que ela é capaz de deixar no mundo. O mais comum é fazer-se uma breve inspeção superficial, avaliando a integridade da casca, o brilho refletido e a simetria das formas, ignorando-se aquilo que os olhos não podem ver.
Aquele que parece distante pode estar lutando contra a barreira da timidez. O muito extrovertido e piadista inconveniente, também – cada um faz uso dos atributos que possui, para lidar com as limitações que carrega, muitas vezes com isso distanciando o ser do parecer. A mulher que parece pisar no topo do mundo pode estar apenas tentando pisar sobre a própria insegurança, enquanto a que parece relapsa - quer seja na vida romântica, pessoal ou profissional – pode, na verdade, ter se cansado de jamais “chegar lá”, perdendo com isso a vontade de lutar.
A verdade sobre toda e qualquer coisa está muito além do que se pode enxergar. Já dizia Saint-Exupéry: “O essencial é invisível aos olhos”. A verdade está no caroço. Talvez ele esteja oco ou repleto de vida... Independente da forma que traga, do que a casca anuncie e do quão suculento, azedo ou doce seja aquilo que o reveste, é lá que mora a essência de tudo, o real valor de todas as coisas – e o caroço das coisas não pode ser determinado por uma convenção qualquer, nem por milhares delas. O caroço das coisas jamais é conhecido, a menos que se faça uma profunda viagem ao centro do mundo guardado em cada sujeito ou objeto.