Ciclo desconhecido

Lara era uma menina pura, criada em um povoado humilde, pasto verde e estrelas cadentes. Passava seus dias auxiliando a vó, brincando com os cachorros e inventando histórias de cinderela.

Certa tarde, percebeu que havia sangue entre suas pernas. Sentiu-se ferida por algo que não conseguira identificar. Aquele “vermelho” a assustara de tal forma que teve a sensação de que alguma doença muito grave a acometera. Começou a chorar baixinho no canto do seu pequeno quarto, onde somente uma cortina de chita soprava vida.

Recusou-se a olhar por entre as pernas para enfrentar o “inimigo” que apareceu, sem pedir licença - somente para assustá-la e fazê-la sofrer.

Começou a sentir cólicas. Chorou ainda mais . E assim ficou: parada e assustada como se estivesse à beira da morte.

Foi quando sua Vó Inácia apareceu e, sem que ela conseguisse esconder as lágrimas e o “inimigo”, afagou seus cabelos com ternura e abriu um manso sorriso. Não ousou fazer pergunta alguma. Somente sentenciou: “minha neta, já não és mais uma criança!”. Sentou-se ao seu lado, pacientemente explicou o que acontecera e fez com que ela vislumbrasse um novo ciclo a partir daquele dia.

Lara emudeceu e questionou-se em silêncio: “por que ninguém ousou conversar comigo a respeito?”. Nenhuma resposta surgiu. Nasceu em um lar onde o jogo foi sempre fechado, as luzes apagadas mais cedo, a omissão permeando atos diários e o desinteresse pela vida exposto na porta da frente. Seus pais mal se falavam, trabalhavam de sol a sol e foi com a vó que ela aprendera as poucas coisas que sabia.

Após um banho, Vó Inácia pegou-a pela mão e levou-a até a cozinha. Lá, entre um pratinho de bolachas feitas em casa e uma xícara de chá, encontrava-se uma rosa branca, displicentemente jogada em um copo de vidro. Era o jeito dela – simples, “tosco” mas, em contrapartida, sensível para prever e contornar o momento, afastar o “inimigo” e brindar o novo tempo.

A partir daquele dia, as histórias de Cinderela começaram a ser contornadas, gradativamente, de forma mais contundente.

25/10/11

Rosalva
Enviado por Rosalva em 26/10/2011
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