VIVER, E NÃO TER A VERGONHA DE SER FELIZ... CANTAR E CANTAR E CANTAR!

POEMA:

CIDADE DO INTERIOR:

Seu garçom, faça o favor de me trazer depressa

Uma boa média que não seja requentada,

Um pão bem quente com manteiga à beça,

Um guardanapo e um copo d'água bem gelada

NOEL ROSA

Dliiiiim doooom... dliiiiim dloooom...

5 horas da manhã e o sino da igreja toca

Chamando as senhoras para rezar uma missa:

Minha avó, as avós dos meus amigos

As amigas da minha avó

E as amigas da avó dos meus amigos

Um monte de senhoras que já batalharam muito

Trabalharam muito: lavaram, passaram, arrumaram

E puseram muitas vezes o jantar de seus maridos

E dos maridos de outras senhoras

O que seria de uma cidade do interior se não tivesse as portas abertas

Da casa de uma senhora a lhe oferecer sempre um cafezinho?

Sem falar no vendedor de sorvetes gritando: “picolé... picolé...!”

O vozeirão do verdureiro vendendo batatas

E o leiteiro vendendo leite cheio d’água

O senhor que vende bolo de porta em porta

E o que vende bolo em sua banca no mercado

Tapiocas, canjicas, pamonhas e pastéis também

O senhor da lanchonete

Uma meia dizia de desocupados jogando dominó

E outra meia dúzia jogando baralho ao lado do cabaré

E no cabaré, as quengas lavando a roupa que usarão a noite:

Top vagabundo, saias curtas e meia-calça furada

Lavando também o salão de drink’s para receber

Os velhos barbudos, babões e bêbados

Lojistas disputando clientes

Meia dúzia de empresários ricos:

Metade honesta, outra metade desonesta

Não podemos esquecer da cambada de políticos ladrões... que dó!

Pescadores carregando tarrafas e redes

Um sapateiro sentando no banquinho

Costurando sapatos velhos e tristes

Tal como tristes são os cabritos na hora do abate para

Seus “couro” virarem sapatos tristes

Já percebeu como é triste a cara de um sapato velho?

Vá ao fundo daquela dispensa velha ou naquele quartinho velho

E olhe aquela tralha velha e sinta quanta tristeza há ali esquecida...

Quantos anos foram pisados por ti em caminhadas tristes

Ou em curtos momentos de glória, nas raras ausências de nossas tristezas...]

Olhe só o vendedor de castanhas em frente ao banco

A prefeitura cheia de pedintes e puxa-sacos

Os pobres garis limpando a sujeira alheia

Ao troco sujo de um salário de misérias

Enquanto fazendo imundícies

O prefeito, secretários, vereadores e seus assessores

Ganham um salário de glória

É isso mesmo, tem gente que ganha pra fazer sujeira

Enquanto quem a limpa não pode nem cuspir em paz

Ah... faltaram os operários e pedreiros

Trabalhando de sol a sol suando o macacão e gritando “GOSTOSA”

Pra gostosa que passa ao lado da obra

Policiais prendendo alguns trombadinhas cheirando cola

E no mercado o marchante ostentando sua peixeira na cintura

Amigos xingando uns aos outros cada um de um lado da calçada

E adolescentes xingando a mãe um do outro

Bom, acho que não me esqueci de nada

Ah, ah... Esqueci sim!

A pracinha da cidade, point aos domingos depois de a missa celebrada

Pelo padre, que na maioria das vezes, é sempre um escroto

E o principal, os boêmios e pinguços

Sentados em bancos sujos de um boteco sujo

Falando de futebol, pendurando a conta, jogando sinuca

E escrevendo poemas

O dono do bar resmungando e os enxotando pra fora,

Ligando para as mulheres dos infelizes

Para levá-los embora!

Enquanto isso, eu...