NO TEMPO DA APANHA DA AZEITONA

É a partir desta altura do início do Outono, que se começavam a apanhar as azeitonas, quando eu era criança e adolescente. Azeitonas para os leitores que nos acessam das latitudes mais a sul, são os frutos das oliveiras, dos quais se extrai o azeite, também chamado de óleo de oliva.

Na aldeia onde nasci e vivi até vir para a cidade, bem como em vastas regiões de Portugal, os olivais, ocupam grande parte dos terrenos agrícolas, mesmo que nessa altura se cultivassem as terras entre as oliveiras, com outras culturas, como trigo e outro cereais e leguminosas.

Não é de admirar, pois quem tivesse azeite para o tempero das comidas, trigo, para a farinha para o pão, feijão e grão, legumes que se guardavam secos, para as sopas e também os pratos mais substanciais, como feijoadas e grãozadas, animais domésticos, como porcos, galinhas e coelhos, cultivasse batatas e hortas durante o verão, tinha práticamente o sustento da família assegurado.

A época das colheitas, iniciava-se pois em Junho ou Julho, com a ceifa do trigo e encerrava-se em Novembro-Dezembro, com a apanha da azeitona.

No tempo em que eu era criança e adolescente, eram as famílias que faziam as suas próprias culturas e colheitas, o pai a mãe e os filhos tinham que ajudar desde pequenos.

Recordo-me das vezes em que tinhamos que se levantar de madrugada, para ir para os campos, nos quais estava já o trigo ceifado pelas mulheres, e tinhamos que ajudar a minha mãe a fazer as paveias, que eram os molhos de trigo, para serem atados com o baraço. Baraço eram cordas feitas de fibras vegetais entraçadas que serviam para atar os molhos, que depois eram empilhados nas carroças ou carros de bois e transportados para a eira para serem debulhados com a máquina debulhadora.

Tinhamos que se levantar de madrugada, porque mal o sol rompia e começava a aquecer, o trigo cortado e seco, ficava quebradiço e era muito mais difícil de empilhar e atar.

Então era lindo quando chegavamos ainda com a madrugada a romper, e bandos de perdizes levantavam voo, no meio do restolho. Restolho eram os cotos dos caules do trigo que ficavam na terra depois da ceifa.

Mas o que era mais chato, era quando iamos a levantar os molhos de trigo, e juntamente com o trigo, vinha algo húmido e escorregadio a mexer-se, como me aconteceu pelo menos uma vez era uma criança com cerca de nove anos. Solto o trigo com o medo, vi que era uma cobra que no entanto estava ainda meio adormecida pelo frescor da noite e se retorcia.

Também acontecia com frequência, serem ratinhos a fugir espavoridos, quando as suas tocas ficavam a descoberto. Eram pequeninos e engraçados.

Também os grãos de bico tinham que ser apanhados de manhã antes de nascer o sol, porque com o calor ficavam muito secos e abriam-se as vagens, além de fazerem bastante irritação na pele.

A seguir eram as vindimas que nos ocupavam, antes da apanha da azeitona. Mas era realmente este, um trabalho que era mais complicado, pois muitas vezes já chovia e fazia frio o que obrigava a outros cuidados.

Mas o que gostávamos mais, eu e a minha irmã, eram dos almoços especiais no campo nesta época. Habitualmente a ementa era um cozido de couves com feijões no qual se demolhava pedaços de pão feito com farinha de milho. Era acompanhado com sardinhas ou carapaus fritos e também podia ser com bacalhau assado.

Tinha um sabor especial comer assim no meio do campo com as oliveiras á volta e as azeitonas prontas para a colheita.

Depois ao fim da tarde, era o regresso a casa com as sacas cheios e ainda o trabalho de limpar a azeitona de ramos e ensacar para levar ao lagar, para extrair o azeite.

Recordações de outros tempos, que certamente teremos que recuperar, nestes tempos de crise em que os campos abandonados são o testemunho dos nossos erros que nos conduziram a este estado de coisas em que vivemos.