Ato de amor brincante
Faço aqui o registro de manifestação espontânea da cultura popular de arte de rua. O palhaço ventríloquo chama-se Estrelinha, faz ponto no contorno do conjunto Ernesto Geisel, em João Pessoa.
Estrelinha jamais vai botar as mãos na grana através da Lei Rouanet ou de qualquer fundo de apoio cultural. Vive de contribuições dos motoristas que passam no contorno.
Estrelinha foge aos padrões do artista que faz parte da elite. Ele não está ali pra competir com ninguém, apenas distribuir sua alegria em troca de algumas moedinhas. Vive disso com muita dignidade. Uns observam, outros absorvem a arte de Estrelinha. Uma piada singela do palhaço, sua alegria simples espalha benefício moral, aumentando um pouco, de alguma forma, a baixa esperança no ser humano.
O humor pastelão e brincalhão do palhaço Estrelinha é digno de atenção. A maioria das pessoas não dá valor ao palhaço. É um preconceito formado. É até ofensa chamar o oponente de palhaço. Mas essa arte é mais profunda do que imaginamos. Palhaço é muito mais do que pintar a cara e fazer palhaçada.
Disseminar alegria é um ato de amor à humanidade.
Passei pelo palhaço de rua e me deu desgosto por não estar no seu lugar, fazendo graça com seu boneco, dizendo bobagens ao léu, sem se importar se alguém ouviu, apenas pelo prazer de ser um idiota feliz. Quem sabe se o palhaço, aborrecido e enfastiado com seu papel, não me viu como objeto de sua inveja, eu no meu carrão popular 1999?
Muita gente quer encontrar um caminho para sua vida conforme a realidade dos outros. Conflitos que nos causam mal-estar, às vezes desajustamento, pensamentos doentios. Olhe para a vida do filho do magnata, que tem tudo e não precisa de nada. Emocional e racionalmente, o cara não tem preparo para essa maratona que é a vida. Ele não enfrenta parada alguma porque não está preparado. “A vida é para quem topa qualquer parada e não pra quem pára em qualquer topada”, raciocinou o grande Bob Marley.
Na minha curta filosofia de botequim, acho que o que dá sentido à vida é a linguagem e o trabalho. Através da comunicação e do trampo, a humanidade conhece, modifica e dá sentido ao mundo, significando o seu universo particular, seu ambiente próprio onde vive. “Não existe periferia, o centro é onde você está”, na lógica de outro pensador do qual esqueci o nome.
Fechando, vai a resposta do Dalai Lama a quem lhe indagou: “O que mais te surpreende na humanidade?” Respondeu: "Os Homens... porque perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem dinheiro para recuperar a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem do presente de tal forma que acabam por não viver nem o presente nem o futuro. E vivem como se nunca fossem morrer... e morrem como se nunca tivessem vivido."
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