A Representação em Crise
 
       Nas marchas contra a corrução ou alhures, escuta-se da boca do povo generalizada decepção com aqueles que o representam, no dia a dia, da sua vida política. Esta generalização caracteriza o tamanho do descrédito, com que apenas parcialmente concordo, sob o princípio de que toda generalização é injusta. Restam sempre sementes que, se derem a elas condições, chances ou oportunidades, serão boas árvores e produzirão bons frutos. O problema mais grave é quando os bons se inibem diante da arrogância e sucesso daqueles que vêm merecendo e cultivando esse descrédito, tendo a mediocridade como régua de tipificação.
       Em “La Condición Social”, o sociólogo jurídico da Universidade de Buenos Aires, Professor Enrique Del Percio, analisa, com objetividade e profundidade, esse fenômeno através do “consumo, poder y representación en el capitalismo tardío”. Segundo Del Percio, a crise da representatividade que deveria ser bem exercida pelos políticos passa pela ótica de cinco enfoques: derivação dos novos meios de produção econômica; velocidade das mudanças no mundo contemporâneo e, consequentemente, desconhecimento do eleitorado sobre o posterior e mutável desempenho dos candidatos; maior e crescente nível educacional dos representados que lhes rendem um maior nível de informação, impondo aos “representantes” uma vexatória adequação às aspirações e demandas sociais no campo político; e, por último, as transformações provocadas pela mídia, de modo especial, pela televisão, pela informática e pela internet.   Conclui Del Percio que, diante da crise e do descrédito, pouca coisa tem mudado, a se ver continuada “la reproducción de los políticos: nada hay más parecido a un gobernante de un país que el anterior gobernante de ese país (...)” E pior, a esperada representação em adequação aos anseios populares é sempre frustrada pela “hegemonia” e pela constante reprodução da inadequada representatividade, na mesma ordem e contínua série, como se fosse a analogia, na “La Reproduction”, de Bourdieu et Passeron: do ovo do pelicano sairá sempre um outro pelicano, que por sua vez, porá novamente ovo, de onde potencialmente se formará o próximo pelicano.  E, assim, vai...
       A inadequação da representatividade se radicaliza quando se verifica que muitos desses políticos não representam o seu eleitorado ou o povo que os elegeu, mas representam claramente a si próprios e seus interesses ou, da mesma forma, um “gruppetto”, cujo poder econômico financiou sua eleição. E assim “la nave va”, e só mudará de rumo quando o eleitorado se guiar pela sua própria bússola, embora já saiba a primeira orientação da agulha de marear: o norte não mudará de lugar.