AS LÁGRIMAS E JOSÉ

As lágrimas existem para lubrificar os olhos. Foram os humanos que as inventaram como reveladoras da tristeza, da ira, do desespero etc. As lágrimas não aliviam, fazem com que os sentimentos se tornem mais fixos, intensos e se legitimem.

José, contrariando a orientação de milhões de homônimos, não é feliz por ser xará do lendário carpinteiro que adotou Cristo como o filho preferido. Aliás, filho feito por ele ou por um desconhecido que chamaram deus? Não queria ter o mesmo nome de um suposto marido traído que é conivente com a gravidez misteriosa de sua própria esposa. Seu nome serve como ornato para adjetivos pejorativos como Zé mané, Zé ruela, Zé rosqueta, Zé da égua, Zé prego, Zé prexeca etc.

Os José, Zé, Zezé são encontrados em qualquer ambiente. Nas feiras, nos botecos, nas rinhas, nos cabarés, nos garimpos e se confundem entre caras engraçadas, descontraídas, desconsoladas, magoadas, enganadas. Esses homônimos, de fisionomias diversas que carregam ressentimentos, mágoas, dúbios sentimentos, incertezas, arrebentam as pupilas para derramar torrentes de lágrimas, algumas vezes desmotivados. Outras vezes com razão – na maioria das vezes desentendidas.

José fica perdido num implexo de lágrimas. O líquido gotejando dos olhos o fazem mais frágil, não menos insensível. Chora quando seu time perde, quando a esposa aparece com uma gravidez inexplicável, quando se conscientiza que é um homem estéril, quando seus pais não lhe deixam a herança que lhe era de direito. Chora por motivos vários. Mas quando precisa lubrificar os olhos para mais nitidamente enxergar o mundo pinga neles duas gotas de colírio.

Joel de Sá
Enviado por Joel de Sá em 16/10/2011
Reeditado em 16/10/2011
Código do texto: T3279749
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