Quatro passos para voltar a escrever

Para não cair naquele esquecimento, ou naquela mesmice, ou para fugir daquela vida medíocre, obsoleta, arrastada e/ou fingida, você volta a escrever. E fica relutando sobre essa “volta” como um daqueles velhos, barrigudos, viúvos que se entregam a uma analise enfadonha do cotidiano alheio por falta do que reclamar na própria vida que não tem mais pimenta, e nem intestino para digeri-la, o suficiente.

Parabéns, você passou para a segunda fase. Você decidiu que pode fingir que não é, nunca foi e nunca será, a decadência personificada. Passo seguinte: abrir o seu computador de última geração, comprado com o dinheiro do seu nem-tão-querido-pai-que-precisa-compensar-a-ausência-de-algum-modo; sentar na sua poltrona com um estofado incrivelmente confortável, com uma caneca de cappuccino e um cigarro, daqueles caros, porque tem que completar a imagem e ficar contemplando o vazio com uma pose artisticamente forjada.

Já na terceira parte, onde não depende de você ou da sua pobreza material (que obviamente não existe) , um enorme espaço em branco é o que aparece no lugar da inspiração, mas quem liga? Depois de um tempo você tem um tumblr, um Caio Fernando Abreu na cabeceira, um maço vazio, um café frio e milhares de amores ridículos frustrados – que nunca existiram, mas todo mundo só fala deles, não é mesmo? – escritos no Word (porque saber escrever corretamente é coisa de gente idiota e você não sabe usar o dicionário).

A quarta parte não existe, porque logo você se desinteressa e vai jogar seus videogames modernos, com seus amigos e algumas garrafas de vodka. Aliás, permita-me uma errata, a quarta parte (quando você realmente leva esse treco estranho que é escrever a sério) é quando você descobre que a sua vocação é se matar, se matar todos os dias para extrair do fundo de qualquer pedaço de cinzas algo de útil – e isso nem sempre acontece e aí vem aquela vontade de se matar literalmente.

- Nenhum ser-humano da terceira idade foi machucado para que esse texto fosse produzido;

- Tenho certeza que o autor acima citado vai me perdoar de dentro do túmulo dele;

- Só quero reforçar que me xingar, criticar, elogiar, ou quaisquer coisas do gênero, não farão a menor diferença na minha vida.

Eduarda Daibert
Enviado por Eduarda Daibert em 16/10/2011
Código do texto: T3279349
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