AS CRIANÇAS DE NOVO
Criança era um problemão na idade média. Filhos de servos tinham que crescer logo para ajudar os pais na lida e formarem-se bons servos. Desde muito cedo já trabalhavam nas lavouras e serviços domésticos nos feudos. Assumiam os lugares dos pais que morriam muito cedo por falta de condições sanitárias e de exaustão no trabalho. Não brincavam, não havia infância.
Os filhos dos nobres eram um estorvo quando pequenos. Não serviam para nada além de dar despesas. Mas brincavam pois sempre tinham um servo, uma mucama, um escravo que lhe serviam para todos os fins, inclusive o de ocupar o tempo não perturbando a ordem nos castelos medievais tão acupados com a administração do feudo e com as festas proibitivas para pequenos. Isso até os seis, sete anos, no máximo. Daí para frente o seu mundo era o mesmo dos adultos. E as relações pais e filhos não eram cercadas de afetividades de pais e filhos.
Na classe intermediária, onde situavam os artesãos e mestres de ofícios, elas eram aprendizes de alguma profissão desde a mais pouquinha idade.
Veio a revolução industrial e demandou muita mão de obra. As crianças foram necessariamente incluídas, cumprindo jornadas de trabalho de adultos. Menos infância.
Passadas duas guerras mundiais, chegou-se a um consenso (na marra) de que precisavam deixar as crianças de fora disso tudo. Novas tecnologias também contribuíram para seu alívio, uma vez que máquinas começaram a substituir o trabalho humano. Então não foi nenhuma benesse a declaração de direitos da criança criada pela ONU em meados do século vinte. Foi um tremenda média que fizeram para os pequenos e também com os pais para que pudessem trabalhar muito, muito e muito pois já não aceitavam mais passivamente tanta exploração no trabalho. Tinham que receber contrapartidas dos estados nacionais e das grandes indústrias que se expandiam na Europa e EUA..
Mas foi benéfica de qualquer jeito. A minha geração, por exemplo, pode ter uma infância bastante livre, leve e solta (apesar de ainda ter que começar a trabalhar muito cedo, quando não se era de família abastada. Fora isso, a infância durava até por volta dos 14 anos.). Hoje, criou-se um amontoado de direitos e leis protetoras da infância mas vejo as crianças perdendo-a muito rapidamente para o medo, para a pressa, para o despreparo, para a violência para a corrida atrás de dinheiro por parte dos pais. Elas tem acesso a tudo e menos tempo para brincar de ser crianças. Estranho, não?
Para quem quiser saber mais sobre a história da infância indico:
Philippe Àries. História Social da Infância e da Família. Rio de Janeiro: Zahar. (1973)
A história das crianças no Brasil, org. por Mary del Priore