A fortaleza do homem comum
Artur da Távola é uma companhia que prezo muito. De certa forma, ele não morreu. Se ainda posso dialogar com ele é porque ele está vivo, para mim. Sim, se você for muito racional, já estará me contestando: “não pode haver diálogo”. Mas aí, meu amigo, você está se referindo à vida superficial. Estou falando de vida mais profunda. Estou intuindo espaços que normalmente não vemos.
Consigo ver seu sorriso maroto e até ouço sua voz.
Hoje, meio chateado com essa vida normal, fui a um dos livros dele.
E passamos a conversar. Não tem poeta que conversa com passarinho, com árvore, com os astros? Qual a surpresa por eu conversar com alguém que gosto muito e que existiu de carne e osso?
Vamos lá, deixa-me continuar. Ele escreveu sobre fraquezas e fortalezas do ser humano. É uma página muito linda. Mas não quero repeti-lo. Ele me disse que temos uma fortaleza bem lá no fundo e que ela pode aparecer se chegamos a ter maturidade.
Enquanto a maturidade não chega, a nossa fraqueza é que vai desbravando tudo. Diz ele que ganhamos prêmios, somos aceitos pela nossa fraqueza.
É com essa fraqueza que conquistamos o mundo. Fazemos amigos, temos amores, fazemos crônicas e poesias. Segundo ele, tudo isso é fraqueza. E é!
Volto a repetir, dá vontade de soltar a página dele, porque ele enumera tantas fraquezas. É uma delícia essa descrição das fraquezas.
Mas quero que a crônica seja minha. Deixa eu botar minha fraqueza pra fora...
Disse para o Artur: “ vou misturar fraqueza com fortaleza, posso?” - ele sorriu e assentiu com a cabeça.
Amigo é assim, faz nossas vontades, mesmo sabendo que estamos errados.
Esclareço que o Távola é que está certo. Maturidade é a coragem para você se aceitar. Lembro-me logo de Paul Tillich com a sua “Coragem de Ser”.
Vou dar meu ponto de vista de homem comum, mas já sabendo que estou errado. É que me deu uma vontade de exaltar o homem simples, o homem da roça, aquele homem que é espetacularmente retratado nos contos da Maria Mineira.
O homem ignorante, que se sente pequeno diante do universo, mas que mesmo assim constrói a duras penas uma família. Que procura dar o bom exemplo aos filhos, à sua maneira. Que tem crendices, que, de vez em quando faz bobagens. Que luta pela vida, que trabalha de sol a sol. Que não desanima. Que, de vez em quando, erra. Mas acha que deve acertar. Que tem uma religião, que não entende muito bem. Mas acredita firmemente num Deus, que criou o mundo que ele conhece e que tudo vê.
Esse homem, meu amigos e amigas, que enfrenta essa vida comum, muitas vezes insípida, esse, para mim, é o verdadeiro herói, é o homem forte.
Isso tudo que o leitor acabou de ler, falei em voz tão alta que cheguei a ver o Artur arregalar os olhos! E com aquele seu jeitão compassivo, sorriu novamente para mim, com o dedo polegar direito levantado, como quem diz: “ de certa maneira, você também está certo”.
Saí da mesa do computador exultante e nem me despedi do amigo. Fui correndo para o boteco da esquina para exercer uma das minhas fraquezas: “ Hélio, me dá uma garapa com um pastel de carne”.