A verdade sobre a crônica



                                
                               O cronista gosta do detalhe, do insólito, do olhar de esguelha.
                               Uma pequena frase, um olhar diferente, um incidente sem importância  na rua,   deixam o cronista em chamas.
                               E são esses detalhes, esses vestígios que as pessoas não dão muita importância, que vão ser o motivo de uma crônica.
                               Por isso as pessoas imaginam que se trata de uma literatura menor, uma literatura apressada. Ledo engano. Os críticos literários, acabei de ler,  já começam  a dizer que a crônica não tem nada de fácil. Eu, particularmente, tomei um  susto  com esta afirmação.
                               Sabe, meu amigo, minha amiga, comecei a escrever crônica justamente porque achava mais fácil. E agora me dizem que não é.   E ainda dizem que o cronista não tem compromissos com coisas sérias. A bem da verdade,    tem!  Mas ele finge. Diz o crítico que acabei de ler.  Finge que não está dizendo verdades. Fala mentiras, para dizer a verdade. E diz a verdade para mentir. Não sei se o amigo está entendendo.  
                               Essas observações, por mera coincidência,  se ajustam à minha personalidade.
                               Gosto de falar verdades, de aprofundar os temas sérios, mas acabo não fazendo isso.  Não, de forma contundente.  Prefiro ser leve, agradável, diplomata e me custa muito dizer verdades,  diretamente.
                               E agora entendo a razão da crônica ter sorrido para mim.  Ela é leve, ágil,  finge que não fala verdades, não ofende, não separa, não cansa e tem fino humor. E é tudo que quero para mim e para os outros.
                               Decididamente,  sou como a crônica,  não quero ser universal. Amo a singularidade. Amo o detalhe. E quanto mais simples melhor.
                               Fico muito contente quando vejo os físicos discutindo e procurando o início do mundo. E o que eles procuram?  Procuram  justamente uma singularidade, este fato único. Este detalhe que, por mágica, fez surgir do nada o Universo.
                               Bem, para ser coerente   comigo  mesmo, vou dizer, brincando,  e com muita diplomacia,  que eles, talvez,        ainda não perceberam que não estamos em um Universo, mas num “Multiuniverso”. Calma, amigos, esta palavra é nova, ainda está sendo inventada.
                               Mas que mania com o número UM. Hum! Não acredito nisso. Simpatizo mais com o número 64!
                               Não teria melhor lugar para falar minhas mentiras ou minhas verdades  senão aqui, escondidinho, nas minhas crônicas.
                               - Então, fala aí uma verdade sua, quero ver. Chego a imaginar o leitor me  instigando a falar umas verdades.
                                Vou dizer uma. Sabem, meus amigos e minhas amigas,   que nunca puni ninguém e que não conseguiria jamais punir alguém?  Me recusaria a punir!  Não acredito em punição. Essa é uma verdade muito minha.  E não pensem que estou sozinho. Montaigne citou um cara lá na antiga Roma que era exatamente assim como eu. Desculpem, amigos, não estou querendo passar a mão na cabeça de ninguém, mas sinto que a punição nunca resolveu nada, deve existir método mas eficaz pra endireitar o homem...                            
                               Já sei, sinto que estão pensando:  “ e a  sua crônica? e a sua crônica?”
                               Mas não entenderam?  Então, não deixei  duas questões bem sérias  para nossa reflexão na hora do cafezinho com o pãozinho de queijo?    Crônica é isso.  Como já disse o Artur da Távola, a crônica toca todos os ritmos ao mesmo tempo: valsa, forró, tango, bolero, samba, rock.  A liberdade é tanta que a crônica pode até virar um conto.  É como tirar leite de pedra...   Pronto.  Acabei!