O PASSARINHO

Meu amigo passarinho, por que você pula de um lado para outro, sem parar um só minuto. Seu canto é bonito, mas triste. E sua gaiola, cheio de alpiste e água, pendurada em um árvore, onde você é admirado e ouvido?

Ah, meu caro amigo, ninguém ainda pode conversar comigo. Somente você, meu amigo humano, desde o dia em que nasci, somente você pode entender-me e saber a minha historia. Você pode tirar um pouco de seu tempo para ouvir-me, perguntou o belo pássaro, em uma gaiola.

- Sim, vou ouvi-lo, com todo o tempo que possuo. Sua história será uma das mais belas, porque muitos precisam saber dela, apesar de sermos separados por milhões de anos de evolução, mas, como um bom apreciador científico, serei o seu maior ouvinte, então conte-me.

- Sim, a minha historia é simples e bonita. Não tem muitos pormenores, mas é...

- Em uma tarde do mês de dezembro, bem perto da Capelinha, em uma árvore grande, cheia de galhos e algumas flores que restaram da primavera, em um galho bem seguro, onde papai e mamãe, com muito carinho e muito amor, prepararam nossa humilde casa. Sim, muito humilde, mas cheia de carinho e de muito amor.

- Minha preparação não foi longa, mas de acordo com a nossa biologia e talvez mais curta de que a de vocês, humanos. Mamãe chocara seus ovos e papai a ajudava. Passaram muito frio e também calor. Passaram eles um pouco de fome, porque muitos de vocês, humanos, puseram tanto veneno nos alimentos, poluíram tanto os rios e lagoas, fizeram tanta queimada, que muitos dos alimentos deles se perderam. Venceram, porque eles tinham muito amor entre si, eles se amavam muito e do amor tão doce e fiel deles foram gerados três ovos, ou seja, eu e mais dois irmãozinhos, os quais não nasceram, porque assim o destino não os quis.

- Papai e mamãe cuidaram muito bem de mim. Davam-me toda a alimentação que um bebê filhote precisa.

- Eles conversam muito comigo. Contavam-me a história de como eles se conheceram, as briguinhas no namoro, o noivado e enfim o casamento. O casamento deles não é igual ao dos humanos, porque nós não precisamos de ritos, de lugares. Somos livres, a cada dia estamos em algum lugar. Comemos ao ar livre, repartimos o nosso alimento com a nossa espécie. Somos unidos, vivemos todos felizes. Não temos roupas bonitas, temos nossas roupas naturais que Deus, Todo Poderoso, nos deu como um presente para nossas vidas. Assim, somos...

- Passaram-se alguns dias. Sempre papai e mamãe conversavam comigo. Ensinavam-me que a vida fora do ninho era completamente diferente.

- Não tínhamos tantos amigos. Os nossos amigos eram as nossas próprias espécies. Gatos e gaviões eram nossos inimigos, mas o maior de todos os inimigos era a espécie humana, não são todos, mas alguns que caçam, que matam, que não se importam com nenhuma coisa.

- Os dias foram passando. Comia bem, ouvia os conselhos de papai e mamãe, ouvia as aventuras de papai para conseguir trazer alimento para mim e meu tratamento foi tão bonito. Aprendi a cantar com eles as mais lindas canções, das quais soavam tão profundamente no coração de todos. Papai dizia que eu seria o rei da canção, porque tinha um bom fôlego e muita afinação.

- Em um domingo pela manhã, ouvi papai dizer para mamãe que já era o momento de eu poder aprender a voar. Muito contente eles chegaram e me deram a notícia de que iria voar pela primeira vez. Iria conhecer a terra como nunca eu conheceria. Iria ver o verde das matas lá do alto. Iria poder beber água no riacho, perto da pedra bonita, iria voar alto, pousar de galho em galho. Iria poder escolher meu próprio alimento. Iria poder voar com meus amiguinhos e apreciar todas as coisas bonitas que Deus criou, inclusive a vida. Iria, enfim, com toda a certeza, ser um dos pássaros mais felizes já passados pela terra.

- Fiquei muito feliz. O momento não chegava, mas a minha vontade de voar era tão grande, tão bela, que o mundo estaria em minhas mãos.

- Conforme de costume, papai e mamãe trouxeram meu alimento matinal e me deram um abraço tão apertado, que parecia que seria o último e talvez uma forte despedida, mas pensei ser uma simples despedida costumeira.

- Meus pais me explicaram o projeto de vôo, de como eu iria fazer. Ter cuidado com os veículos, com o fio de eletricidade, com os prédios. Assim, que eu voasse, mamãe traria para mim um pequeno pedaço de flor, que seria a minha liberdade.

- Assim, o fiz. Sai do ninho, dei um grande salto, comecei a bater minhas asinhas e meu primeiro vôo foi o mais bonito. Voando, senti papai e mamãe batendo palmas para mim, parecendo um troféu tão belo que eles me deram.

- Tudo ia bem, mas eu me apavorei e trombei em uma parede de um prédio. Mamãe e papai assustaram e vieram ao meu encontro, mas foi em vão.

Em uma pequena pausa, o passarinho soltou algumas lágrimas e continuou:

- Mamãe, apressada, não viu o automóvel em alta velocidade e foi atropelada, morrendo na hora.

- Papai, muito triste, ainda em estado de choque sobrevoou perto do corpinho de minha mamãe e foi assassinado por menino mal, com uma pedrada.

- Comecei eu a chorar, mas meu choro não saia. Parecia ser um pesadelo, um sonho em que eu ainda não acordara, mas era a realidade.

- Então ouvi uma voz, de um homem que dizia eu valer uma fortuna. Pegou-me com sua mão, colocou-me dentro de uma caixa e me vendeu em um mercado.

- Meu dono é bom, mas...

- Sou um pássaro e como pássaro preciso ser.

- Não entendo as leis humanas. Tais leis poderiam ajudar a todos, mas não é assim.

- Prenderam-me dentro desta gaiola sem eu ter cometido crime algum.

- Não posso voar e admirar o espaço que Deus me deu. Não posso conversar com meus amigos, porque não os tenho, porque eles têm medo dos humanos. Não posso cantar igual a meus amigos, porque não os compreendo. Não posso ter uma família, porque não tenho a liberdade para escolher minha esposa e ter meu próprio lar, nas alturas, enfim, sou...

- Sim, meu pobre pássaro, você é um grande herói. Enfim, dizia eu para o pássaro, em voz alta, você é um grande herói. Se eu pudesse libertaria você. Vou falar imediatamente com seu dono e contar-lhe a sua história.

-Não, respondeu o pássaro. Ele não compreende. Ele pagou muito caro para minha prisão. Ele ganha prêmios e troféus em festivais em que participa. Ele é ganancioso e ambicioso. Ele quer tudo para ele. Não diga nada.

- Diga sim para todos. Conte a minha história para todos. Eu era feliz quando tinha minha família. Agora canto para as pessoas. Canto para não chorar.

- Meu amigo humano, esta foi minha história. Você foi o único que me entendeu. Adeus, terei que parar de conversar porque meu dono está chegando. Ele não gosta de mim e nem de você, Adeus...

Desta forma, chegou o dono do passarinho, mal humorado e mau educado, pegou o pássaro, que estava no recinto da exposição e foi embora.

JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO
Enviado por JOSÉ CARLOS DE BOM SUCESSO em 01/10/2011
Reeditado em 07/10/2016
Código do texto: T3251823
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