NOITE FELIZ

Meu avô, lembras, das noites consideradas natalinas, à espera daquela que culminaria na que era consagrada a Ele?

Lembras das carruagens enfeitadas com luzes, enluaradas, fogos riscando céus e meus olhos abertos, apreciando, encantado a beleza de anjos vestidos de gente?

Lembras das tuas frases curiosas, tuas histórias brilhantes, teu afago em meu peito, enquanto seguravas firme a minha mão, assim, pequena, na tua tão grande? Mão de avô, firme, forte, segura. Lembras? Não, não mais lembras e se o fazes, deve ser de uma maneira diferente em que as lembranças ecoam em patamares distintos, sem esta melancolia que me atinge, certamente, eivadas da mesma alegria que havia antes. Talvez não haja mais passado para ti, nem futuro. Só o presente em que me acompanhas de longe, do lugar onde estás, inspirando nos meus ouvidos melodias de poemas, que inventas sem que eu perceba, para que seja feliz. És bem capaz disso. Teu coração sublime, tua voz suave e inabalável. Tuas histórias em que me incluías ao lado de cada herói, de cada passagem mais vibrante, onde a vida brotasse inteira em nossas mãos. E eu ficava ao teu lado, observando o brilho que translucidava o teu olhar, iluminando o teu rosto, ressaltando os fios brancos de teus cabelos, mostrando-te quase um espectro na noite. Noite de estrelas. Noite de luzes e vozes. Noites de alegria e paz. Quisera te ver ainda, rodeado desses bônus que a vida, às vezes, nos proporciona. Quisera sentir a brisa leve no rosto, percebendo o friozinho gostoso do sereno, mergulhado na espectativa das celebrações, dos corais, dos anjos, das bailarinas, da música, do presépio, do menino Jesus na manjedoura. Tudo acompanhado por ti e em ti, esperando ainda mais, na ilusão de ser criança e feliz. Quisera estar ainda ao teu lado e sentir que o espírito de Natal ainda permanece, experimentar ainda a brisa suave, o abraço afetuoso, a segurança e a certeza do afeto. Mas esbarro numa criança, alguém que se apressa para não perder nenhum acontecimento nesta noite tal como eu fazia, e me volto surpreso. Por um momento, imaginei que estavas aqui, tão próximo, infundindo em minha alma este desejo de ser feliz, de experimentar novamente o espírito sublime desta noite. Quem sabe me inspiraras mesmo e eu compartilho também esta Noite Feliz?

Gilson Borges Corrêa
Enviado por Gilson Borges Corrêa em 22/12/2006
Reeditado em 22/12/2006
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