"O Chic dos Bregas..."

As luzes multicores na fachada, denunciam o estabelecimento onde homens e mulheres se misturam, envoltos por uma atmosfera esfumaçada dos cigarros fumados, em meio a um ambiente de luz tênue, onde se delineam as curvas generosas dos corpos femininos, exalando perfumes, muitas delas com vestes que provocam a imaginação e a libido de quem as observe. No limiar de seu interior, mesas espalhadas no salão, acomodam casais ou mesmo alguns solitários que, consumindo geladas cervejas ou outra bebida, observam as evoluções dos casais na pista de dança.

Na velha vitrola, um 'long-play' de Lindomar Castilho depeja o potente som de seus boleros de 'dôr-de-cotovelo' para que os casais possam dançar mais intimamente agarrados, rosto com rosto, bôca no ouvido em segredos de 'liquidificador', como na música do Cazuza.

Um maço de Hollywood, Carlton ou Minister, descansa sobre a mesa e, está à disposição daquelas que se aproximem em busca de oferecer companhia ao solitário freguês que, pacientemente percorre seu olhar pela periferia, à cata de uma 'prenda', enquanto saboreia pequenas goladas do rum com coca-cola e gelo, bebida mundialmente conhecida como 'Cuba-Libre'.

Por detrás do balcão do bar e, de impecável limpeza está a, e por vezes opulenta, a matriarca zeladora do local que, com olhos bastante experientes, consegue advinhar as necessidades de sua freguesia, determinando a cada 'pupila' as orientações para um bom atendimento pois, em geral, o lema será sempre a 'satisfação garantida ou o seu dinheiro de volta'. E a satisfação será sempre garantida.

A noite segue lenta e os casais agora trocam juras de amor e de lascívia, pelo menos momentâneamente ou, enquanto durar o idílio, em que a velha vitrola agora toca outro bolero no estilo de 'revolta' com Carlos Alberto.

Há momentos de festa e alegrias no salão quando alguém mais 'alto', etilicamente falando, solicita uma música mais alegre e agitada. É quando entra uma 'lambada' ou 'merengue', daqueles bem campestre e que hoje em dia anda um pouco ou bastante esquecido. Geralmente são músicas orquestrada e soladas por Ivanildo do Saxofone ou pelo Pinduca.

Outras páginas do nosso cancioneiro nacional e também internacional fazem parte da 'discoteca' do brega. Roberto Carlos batia disparado com 'Amada Amante' e outras canções de cunho romântico. Julio Iglesias, com sua voz melosa era, disparado, campeão absoluto para o 'pré' aquecimento para a conjunção carnal que, previamente acertada e paga à cafetina, liberava a chave do pequeno quarto, um cubículo exíguo, onde os casais teriam alguns minutos de sexo e amor.

No brega, aportavam pessoas das mais diversas situações. Trabalhadores, maridos em crise com suas esposas, maridos traídos, garotos imberbes que para lá se dirigiam para o 'batismo' sexual com a primeira noite com uma mulher. Homens solitários, poetas (muitos da geração de Castro Alves inspiraram-se nestes 'bas-fonds'), além de sociólogos e antropólogos, na busca não só da diversão, como também do entendimento da raça humana.

Das 'meninas' que fazem o salão, muitas delas têm histórias que, se compiladas, dariam um 'best-seller' de desgraceiras de vida. São histórias de abuso em família, traições conjugais, enganos pela vida e, todas vem das mais diversas partes. Baianas, sergipanas, alagoanas, pernambucanas, capixabas, potiguares, paraenses, cada uma com a sua história de vida.

Algumas delas têm filhos de pais conhecidos e que não assumiram a paternidade, enquanto que outras simplesmente não sabem quem seria o pai do fruto de seu relacionamento. Muitas delas dizem estar nesta vida provisoriamente pois, tentam ajuntar algum dinheiro para 'comprar' suas liberdades, além da vontade de algumas delas em retornar a seus lares paternos, arrependidas e envergonhadas pela vida que optaram mas, algumas despesas e os parcos 'programas' não permitem um pecúlio mais alentador e, a ilusão dorme, literalmente, nos sonhos utópicos de cada uma delas, já que as alegrias tem um período efêmero, dura apenas uma noite e os dias são absorvidos por outros devaneios e sob a luz inclemente de uma realidade mais cruel.

O brega é chic. O brega é poético. O brega é sofrimento em canção. Mas, enquanto a triste realidade não se esmaece, uma nova noite no brega se avizinha e, com ela, as mágoas e tristezas estão disfarçadas e escondidas como nas maquiagens e na penumbra das luzes tênues que, juntamente com a fumaça dos cigarros e o inebriante das bebidas

sucitam à uma realidade que ninguém quer admitir, enquanto a orquestra 'Românticos de Cuba' toca 'Perfídia'.

Braga. Uma instituição em instinção.