Que força é essa?
Logo depois que retiraram as migalhas do café da manha, apareceu sabe lá Deus de onde, uma flor. Morena,
cabelos médios escuros, corpo esguio, 165 cm de doçura. Menos de 60 kg de vida. Menos de 36 anos de peso.
O gosto ruim dos remédios por via oral atrapalha o paladar. A gente perde o prazer de comer, embora seja sonso o gosto das comidas. Os ferimentos dos tubos.
O desconforto do scalpe. O silêncio respeitoso.
O roupão do paciente aberto atrás humilha,
embora facilite o trabalho dos deuses da saúde.
O que adianta cobrir a frente e mostrar a bunda?
Duas mãos macias, dedos longos, uma unha em
cada mão com estrelinhas, pegam a minha. Observo que não tem anéis, não tem pulseiras, mas tem a marca
de onde saiu recentemente uma aliança.
No jaleco branco, Dra. Luciana.
No reflexo do inox do suporte de soro vejo a praça deformada. Lá fora um mar de vida, embora a
cidade não seja litoral.
No litoral estou eu, entre a vida e o fim.
Aquela mão benta, suave, me toca a testa.
Sinto-me ungido. Ela me ouve.
As vezes palavras de conforto, de otimismo, arrancadas
das suas próprias dores,
são bálsamos para apaziguar esses demônios que
cutucam meus remorsos. Os amores vividos.
Os amores perdidos. As vivências interrompidas por orgulho, por pressa, por incompatibilidade de gênios. Quanta idiotice. Quantas lágrimas derramei, e quantas fiz derramar. Quantas dores eu tive. Quantas eu fiz ter.
Dentes de marfim, organizados como teclas de piano, perfeitos. Lábios levemente contornados de rosa. Um sorriso calmo entregue em troca das minhas dores.
Ela está aqui.
Meu tempo acaba.
Minha confissão continua rolando na memória.
Ela se levanta, se despede. Promete voltar. Minhas mãos ainda estão quentes, pelo afago que recebi.
Fico imaginado, o que fez essa deusa sair do casamento. Que força tem essa moça para amansar um paciente terminal, e não a usou para amansar um marido.
Ela sai.
Se eu viver até a próxima visita, vou perguntar.
Logo depois que retiraram as migalhas do café da manha, apareceu sabe lá Deus de onde, uma flor. Morena,
cabelos médios escuros, corpo esguio, 165 cm de doçura. Menos de 60 kg de vida. Menos de 36 anos de peso.
O gosto ruim dos remédios por via oral atrapalha o paladar. A gente perde o prazer de comer, embora seja sonso o gosto das comidas. Os ferimentos dos tubos.
O desconforto do scalpe. O silêncio respeitoso.
O roupão do paciente aberto atrás humilha,
embora facilite o trabalho dos deuses da saúde.
O que adianta cobrir a frente e mostrar a bunda?
Duas mãos macias, dedos longos, uma unha em
cada mão com estrelinhas, pegam a minha. Observo que não tem anéis, não tem pulseiras, mas tem a marca
de onde saiu recentemente uma aliança.
No jaleco branco, Dra. Luciana.
No reflexo do inox do suporte de soro vejo a praça deformada. Lá fora um mar de vida, embora a
cidade não seja litoral.
No litoral estou eu, entre a vida e o fim.
Aquela mão benta, suave, me toca a testa.
Sinto-me ungido. Ela me ouve.
As vezes palavras de conforto, de otimismo, arrancadas
das suas próprias dores,
são bálsamos para apaziguar esses demônios que
cutucam meus remorsos. Os amores vividos.
Os amores perdidos. As vivências interrompidas por orgulho, por pressa, por incompatibilidade de gênios. Quanta idiotice. Quantas lágrimas derramei, e quantas fiz derramar. Quantas dores eu tive. Quantas eu fiz ter.
Dentes de marfim, organizados como teclas de piano, perfeitos. Lábios levemente contornados de rosa. Um sorriso calmo entregue em troca das minhas dores.
Ela está aqui.
Meu tempo acaba.
Minha confissão continua rolando na memória.
Ela se levanta, se despede. Promete voltar. Minhas mãos ainda estão quentes, pelo afago que recebi.
Fico imaginado, o que fez essa deusa sair do casamento. Que força tem essa moça para amansar um paciente terminal, e não a usou para amansar um marido.
Ela sai.
Se eu viver até a próxima visita, vou perguntar.