Sabiá boêmio
Dia desses, em São José dos Campos, fui despertado pelo gorjeio de um sabiá às três e trinta horas da manhã. Um gorjeio vibrante penetrando e quebrando o frio mudo da madrugada.
Eu não sabia que esse pássaro canoro cantava na baixa madrugada. Sempre ouvi o sabiá-laranjeira, da praia ou da mata - desdobrando seu recital pelas manhãs e tardes ensolaradas, principalmente quando pedindo chuva. Pois, é assim: Sabiá quando canta demais quer chuva...
Esse sabiá de São José dos Campos parecia um soprano vaidoso se exibindo, creio, para milhares de ouvidos insones ali do centro, perto da Universidade do Vale do Paraíba - Univap, pois, naquela hora da madrugada, não havia a concorrência do barulho dos automóveis e do vozeio dos transeuntes. Era só mesmo o seu gorjeio trespassando a madrugada.
Devo ao sabiá muitas oportunidades de prazer, degustando com a alma seu cantar, mas também é uma ave que nos ensina a arte de sobrevivência na cidade. Onde sabiá canta, não há tristeza.
Mas, também aprendi com ele, quando criança, que mamão é uma fruta deliciosa, ao ver a avezinha arisca entrando e saindo de um buraco que fez num mamão maduro, sempre com o bico molhado e abastecido. Até hoje sou apreciador diário dessa fruta, e muitas vezes, comendo, me lembro daquela cena.
Adormeci ouvindo o sabiá e, ao despertar, ele continuava cantando por volta das 8.30 horas. Seria a mesma ave? Como poderia uma avezinha dessas ser tão resistente?Um pulmão tão pequeno animar a sinistra paisagem noturna das ruas desertas?