A solitude necessária

Há alguns períodos em nossas vidas em que nos deparamos com o vazio, o silêncio e o afastamento de todos aqueles que estimamos. Nos damos conta de que estamos sozinhos, sem nenhuma sustentação, nenhum alicerce. Fica, no lugar de tudo o que parece distante, aquele buraco incômodo que nada o faz deixar de existir. Nada que possa preencher, ocupar, substituir. O mundo parece se deslocar, deixando-nos isolados de todo o resto, nos privando da presença humana, da felicidade e, sobretudo, de viver bem.

Há, também, a sensação de nada ser o suficiente para suprir a falta do que nem ao certo sabemos o que é. Estamos envoltos de todas as pessoas que conhecemos, mas nada parece ser adequado para caber em nós. É estar sozinho em meio à multidão, sentindo a falta de uma única pessoa. Ou então a felicidade que não nos atinge, os sorrisos que não cabem em nossa boca, tudo o que acontece e que não pode, de certa forma, chegar até nós.

Mas existem aquelas fases em que bloqueamos a entrada do que quer que seja. Nos afastamos um pouco das pessoas, deixamos de viver coisas novas e entramos no período de "fechado pra balanço", momento em que queremos o vazio, o silêncio, o "estar sozinho" para poder refletir sobre a nossa vida, nossas escolhas, as pessoas, nossos planos, sonhos e problemas nos quais percebemos que devemos focar. E isso não é solidão, é solitude.

Esses momentos servem para avaliarmos tudo ao nosso redor com mais atenção e cuidado. E avaliar a nós mesmos requer total isolamento. Não como forma de querer evitar tudo e todos e fechar o mundo pra visitação. Mas para aproveitarmos melhor o tempo que temos para poder nos conhecer, avaliar cada mínimo detalhe e tomar conhecimento sobre como estamos e queremos viver. Serve como forma de auto-conhecimento. É sumamente importante termos algum tempo para nós mesmos.

Escolhemos estar sozinhos, trancados, sem ninguém. Escolhemos o afastamento das pessoas que estão ao nosso redor. Optamos por nos manter reservados e guardamos para nós mesmos os problemas, os motivos e os porquês de estarmos assim, querendo distância de tudo. Mas isso não significa que estamos nos isolando do mundo simplesmente por pura vontade de querer a solidão como companheira. Não, a solidão a gente não escolhe. Não escolhemos querer o vazio imenso e doloroso que toma parte de tudo dentro de nós. Não queremos o gosto amargo que fica ao estarmos sozinhos por preferir assim. O que escolhemos é o tempo em que precisamos ficar sozinhos para algum fim em especial. E isso não é ruim e errado. Não significa que não queremos mais ninguém por perto, que nos ajude e que nos entenda. É preciso, necessário e fundamental conhecermos a nós mesmos, e para que isso ocorra, é necessário o isolamento. É preciso o momento de estar sozinho.

Se há assuntos pendentes consigo mesmo, permita-se colocá-los em dia. Se algo precisa ser avaliado, se dê algumas horas para que o possa fazer. Se há indecisões que precisam apenas de um empurrão final, o faça. Se não sabe ao certo o que quer, o que procura, como tem lidado com tudo o que acontece e que vive, busque compreender isso. Se conheça o suficiente para saber quem, de fato, você é. Vá atrás daquelas respostas que todo o caos do dia a dia não lhe permite enxergar. Reflita sobre quem entra e sai de sua vida, quem o machuca, quem o faz feliz. Permita-se a tudo o que for possível.

Lembre-se que Solidão e Solitude são palavras distintas. Ainda assim, vale lembrar que uma pode levar a outra, e que como qualquer outro sentimento, demasiadamente, pode se agravar. É preciso saber quando é dada a hora de conectar-se novamente. Podemos ficar longe o necessário somente para se fazer aquilo que fora pretendido de início. Ninguém vive sozinho a vida toda e nem deve tentar, todos nós precisamos de outras pessoas para seguir em frente em todos os aspectos da vida.

Solidão está naquilo que não podemos tocar, em sentimentos que nos golpeiam sem pedir licença e que não encontramos uma forma de tirá-los de onde estão. Está na perda de pessoas queridas, no que não podemos influenciar, alterar. Está nas mudanças que não conseguimos nos adaptar. Nas pessoas que, aos poucos, vão nos esquecendo. Nas lembranças que ficam no lugar do que já não temos mais. Está no ciclo da vida; adormecido dentro de nós, em lugares que não vemos. Está na falta de determinada pessoa; no amor que não é correspondido; nas noites que passamos em claro; na ausência de certas coisas; em tudo o que não conseguimos nomear; em tudo o que não conseguimos explicar; no vazio que nada preenche.

Solitude está na busca pelas respostas; no auto-conhecimento; na oportunidade de estar em dia consigo mesmo. É buscar recolhimento para melhor avaliação e compreensão. É a tarefa necessária de buscar os problemas, os erros, os defeitos. Na maneira de se conhecer o que ainda não tinha; descobrir o que julgava não ser possível. Optar por estar sozinho sem a dor que você não sabe como evitar, querer por ser preciso e não por não ter escolha. É viver momentos de inspiração, aprendizado, de saber lidar consigo mesmo. É dar mais valor aos pequenos prazeres que nos acompanham nesses momentos. É aprender a ser mais resistente, forte, estar preparado pro que for. É, principalmente, tornar-se capaz. Enxergar a si mesmo, tudo que o envolve. E saber sempre quando é hora de ir e de voltar. É saber separar os dois mundos; o seu, e o de fora.

Tem muito a ganhar aqueles que não se enchem de dívidas para consigo mesmo. Tem muito mais ainda a ganhar aquele que sabe reservar um tempinho para si. Não é preciso ter medo de se afastar, de perder algo por conta desse isolamento ou de não saber voltar. Praticar a solitude nada mais é que estar em frente à balança pessoal, pesando o que se adquiriu em determinado tempo. Abster-se é aprender a estar sozinho, a saber lidar com as coisas que a vida põe em seu caminho. Abster-se é preciso, necessário e essencial. Pratique.

Tamires Marin
Enviado por Tamires Marin em 27/09/2011
Código do texto: T3243106
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