SOLIDÃO

Ninguém se engane, a solidão é um monstro sem cor, indistinto, surdo e sombrio. Seus efeitos sobre a emoção humana são capazes de transformar raciocínios e transtornar corações, deprimir com ensurdecedor silêncio, entristecer como um rio de lágrimas, fazer chorar o mais insensível das criaturas humanas, surtar a ponto de enlouquecer. Pois esse estado social de ânimo, de espírito e de alma fere mortalmente o coração, golpeia-o com adagas de titânio. A criatura solitária como que se vê um molambo desprezado, algo descartado, muro de lamentações, e derrama seu lamento sem perceber porque é perceptível sua amargura, e parece mostrar-se quase a gritar através dos olhos lacrimejantes e constantemente vidrados.

Tão extraordinária é a solidão, no sentido mais amplo e soturno que se possa ter desse substantivo, que o ser humano, arrebatado pelo furacão de estar só, perdido por não poder contar com um ombro amigo, sem condições de ouvir palavras de conforto, comete atrocidades emocionais consigo mesmo. Esse vácuo na alma humana é capaz de proezas incríveis, como levar alguém a, desprovido de companhia e na ânsia incontrolável de se saber gente, de se ver reconhecido como uma pessoa cuja vida palpita e respira, ir a um orelhão e discar para o próprio celular somente para escutar o toque do aparelho e imaginar que alguém poderia estar ligando para ele. Então, sorrindo todo satisfeito, simplesmente fazer de conta que ignora a chamada após diversos toques e desligar. Esse inesperado e excitante prazer inexistente alivia momentaneamente seu estado lúgubre, como se tivessem lembrado que ele existe.

Às vezes basta um mero olhar aureolado de sorriso a ele dirigido, ainda que seja apenas por simples simpatia ou gentileza, para o solitário exultar, sentir o coração disparando de felicidade por ter sido notado, alegrar-se por inteiro ao notar que sua presença não é de todo desconhecida da multidão. Sorriram para ele, e isso já é suficiente como entusiasmante consolo, como se o tivessem abraçado de forma afetuosa, como se esse interesse por sua existência cimentasse nele todo tipo de sentimento nobre, de reconhecimento, de apreço, de encorajamento, de amizade. O solitário se contenta com tão pouco, as migalhas lhe são, muitas vezes, suficientes para deixá-lo confortável e feliz.

Vasto e monótono é o mundo da solidão, é excesso de triste abandono, de absurda melancolia, de extremo silêncio, de inusitado mutismo, à guisa de imensas florestas virgens, de grandiloquentes montanhas inóspitas, de incomensuráveis planícies extensas, de insuperáveis e misteriosos oceanos profundos, de infinito céu deserto num espaço inimaginável. Quem dele padece passa por tormentosas agruras, por inusitados instantes de estar sem ninguém quando a multidão o cerca. Enfim, a solidão é dolorosa, é morrer estando vivo, é o sono dos injustos, é a injustiça sobre os inocentes, é o viver estando morto para o amor.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 26/09/2011
Reeditado em 26/09/2011
Código do texto: T3242730
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