Corruputos e indiferentes
O Brasil está estarrecido diante dos escândalos de corrupção proporcionados pelos ministros dos Transportes, Agricultura, Turismo e seus asseclas. Aliás, escândalos desse naipe, não é novidade no governo, basta puxarmos pela memória e teremos um leque de primeira linha, tais como: Valerioduto, Mensalão, dinheiro na cueca, na meia, meu Deus! São tantos escândalos que se torna impossível e cansativo enumerá-los.
A Polícia Federal desencadeou uma operação, (mais uma) que resultou na prisão de trinta e poucos políticos presos, inclusive os chamados “figurões”. A mídia alardeou e os brasileiros bateram palmas para os policiais; uma chama de esperança se acendeu. A presidente Dilma manifestou vontade em fazer a tão esperada faxina nos ministérios, todavia, ela conforme seu pronunciamento, se situa na fronteira entre a racionalização que justifica o crime e a consciência que produz a culpa. Quer, mas não faz.
Com o efeito de um balde de água fria, aproveitando as “brechas” da lei, os advogados rapidamente conseguiram habeas corpus para todos, e assim, eles estão soltos e pimpões por aí. Para dar um ar humorístico aos fatos um dos presos pagou a fiança com um cheque sem fundos, fato amplamente divulgado pela imprensa. Como se vê, zombam e não respeitam a justiça.
Shakespeare, célebre conhecedor da natureza humana, fez com que Ângelo, em Medida por medida, pronunciasse as seguintes palavras: “Uma coisa é ser tentado e outra coisa é cair na tentação. Não posso negar que não se encontre num júri, examinando a vida de um prisioneiro, um ou dois ladrões, entre os jurados, mais culpados do que o próprio homem que estão julgando. A Justiça só se apodera daquilo que descobre. Que importa às leis que ladrões condenem ladrões?”
Pois, é! A corrupção enoja e torna a própria atividade política ainda mais desacreditada, se é que isso é possível. Os que detestam a política e os indiferentes regozijam-se. Eles não sabem que sua indiferença contribui para a manutenção e reprodução desta corja de ladrões que, desde sempre, espreitam os cofres públicos, prontos para dar o golpe à primeira oportunidade que surja.
Na obra de Sartre, O Existencialismo é um humanismo, extrai-se a frase que parece ser o lema dos políticos que reinam e cobrem de nódoa Brasília; "Se Deus não existe, tudo é permitido. Se Deus não existe, então não há crime e não há pecado; tudo é permitido". A afirmação era feita em tom de censura. Uma afirmação que vem a ser a razão cínica que dilui qualquer postulado moral.
Ignorar e lavar as mãos alimenta a corrupção. Quem cultiva a indiferença, o egoísmo ético do interesse particularista, é conivente com o assalto ou é seu beneficiário.
No mar de lama que chafurdam os políticos existem alguns gatos pingados que são honestos; assim sendo, não se deve nivelar todos os políticos e debitar a podridão apenas a estes, existem também outras classes caindo de podre, como os empreiteiros e construtores. Os políticos, pela própria atividade que desempenham, estão mais expostos. No entanto, não há corrupção, sem corruptores e corrompidos.
Diz o dito popular que o ladrão aproveita a ocasião. Então, é questão de ocasião, de tentação? Nesse caso fica difícil manter a coerência entre pensamento e ação, discurso e prática.
Os homens são julgados por suas obras e apenas através delas é que se pode comprovar a sua capacidade de resistir à tentação.
Pedagogicamente, a educação se dá pelo exemplo. Exigir ética dos políticos é hipocrisia; assim, não podemos exigir ética na política.
Ao que parece a lei não chega aos políticos. A imprensa faz a sua parte divulgando os crimes e escândalos políticos, como consequência eles são afastados dos cargos, creio que somente para dar uma satisfação ao povo, todavia, alguns meses depois estão de volta em cargos melhores.
Nada os atinge, a não ser o alento dos habeas corpus. O povo brasileiro tem boas leis, o que falta é boa aplicação, principalmente no que concerne aos políticos.
Com leis penais executadas ao pé da letra, cada político pode calcular exatamente os inconvenientes de uma ação ilegal; e isso é útil, porque tendo certeza da aplicação da lei, certamente pensará duas vezes antes de surrupiar o cofre público. O endurecimento da legislação penal serve, sem dúvida, à diminuição da impunidade, para o que devem concorrer também as leis mais objetivas, com aplicação severa. Contudo, ninguém inventou ainda um instrumento útil que possa substituir a consciência individual.
A verdade é que a lei será sempre impotente para conter a mão criminosa se houver algo na consciência do criminoso a lhe dizer que tudo lhe é permitido, pois, o braço da lei não lhe alcança.
As leis são manifestações do pacto que todos firmamos em sociedade, contudo, jamais terão o poder de incutir uma moral, por mais tolerante que seja a quem se considera acima dela.