A GARAPA

Às vezes estou sem muito o quê fazer, mas também não tenho vontade de escrever. Esquisito! Mas descobri que a vida é assim mesmo. Então, quando estou neste estado, tento selecionar sobre o que escrever.

E num desses estados, minha esposa solicitou que buscasse garapa – aquele caldo ‘melado’ da cana. Fui.

Rodei a cidade – sabia onde estava – mas queria um mais perto, o que não foi possível – dirigi-me ao local. Pus-me a observar o processo.

Processo doloroso, mas preciso. A cana – aquela planta trazida, salvo engano, pelos holandeses para Pernambuco e que depois se estendeu pelo imenso Brasil – quieta, limpa, estava num canto do carrinho moedor. Solicitei dois litros do melado – mas, com limão: caso contrário ninguém em sã consciência bebe tanto – e com gelo.

Começou o processo. A moenda foi ligada. Dois pedaços foram introduzidos com maestria pelo ‘garapeiro’ – por assim dizer. Oras, garapeiro é quem gosta da garapa, ou quem extrai o precioso líquido da cana? Deixamos para outro dia. Vou pesquisar sobre, depois. Passou-se a primeira vez, depois a segunda. Bagaços saíram. Dobrou-os e passou novamente. Cortou o limão, introduziu-o no meio dos bagaços – mas ainda com caldo – e passou mais duas vezes pela moenda.

O caldo estava pronto, gelado. Levei-o para casa. Saboreamos prazerosamente o líquido de tom verde-marrom-escuro. Doce. Frio. Apenas um tom fraco de limão ao fundo – que era necessário.

Assim, a observar a cana, somos nós. Passamos por tantos processos, mas no fundo, depois de tantos apertos, SOMOS – salvos alguns que foram colhidos de más terras que não se tornam gentis.

Janeiro de 2003

Prof Pece
Enviado por Prof Pece em 20/12/2006
Código do texto: T323660