Funcionária do mês.

Domingo de manhã eu abri os olhos pela primeira vez no dia depois de algumas horas pensando em como eu queria não ter que abrí-los mais.

Acordei e fui de encontro a mais um dia iminentemente ruim mas esperançosamente bom, afinal, o que me faria continuar acordando senão o desejo de mudar essa merda?

Me levantei. O perceptível caos do meu corpo e mente esbarrava contra os objetos que a Priscila deixou no chão do quarto enquanto a Suellen acordava com o barulho que eu fazia. Não me arrependo de ter ido morar com amigas, mas têm dias...

Minhas costas e seios doíam. É que não basta nascer, tem que nascer mulher pra se foder mais ainda "naqueles dias".

Usava a blusa que minha mãe me deu na minha última visita à casa dela. Se ela visse, falaria muitas e boas e isso fez o primeiro e provavelmente único sorriso do dia aparecer. Ai, que saudade da minha família.

Ufa, passou.

Enquanto a água do café fervia eu acendia um cigarro, debruçada sobre a janela da cozinha pra não entrar fumaça dentro de casa. As meninas não fumam e a minoria sempre se fode. E eu devo ser minoria em tudo. Não que isso seja ruim. Depende. Ou não, seilá.

Pensei em tudo o que eu tinha que fazer no dia e planejei rapidamente como o faria, mesmo sabendo que não ia fazer nem metade.

Derepente uma onda de raiva: lembrei que saquei uma grana do cartão de crédito um dia antes de ele virar, crente de que ia pagar só daqui uns 40 dias, agora tenho uma semana pra tirar esse dinheiro não sei de onde. Preciso de mais um emprego, preciso de (mais)dinheiro, minhas costas doem.

Ia sair pra beber uma cerveja na noite anterior, mas lembrei que "Porra, têm os relatórios pra segunda!" .Tomei meu café e coloquei minha camiseta e tênis preferidos. Eles estavam novos e isso me deprimiu um pouco. Eu estava diferente e meus pés quase formavam calos de tanto usar salto. Minhas unhas estavam bonitas e sobrancelha feita.

Definitivamente, eu não era mais a mesma.

Tentei -sem sucesso- não pensar nisso e me consolar com o fato de ter um salário relativamente bom.

Antes de sair, fui até o quarto me olhar no espelho.Os olhos estavam mais fundos, eu tinha engordado um pouco na barriga e meu cabelo estava maior. No lugar dos desenhos estão os relatórios. Nem vi que troquei o Bilhete Único pelo cartão de crédito. Tentei me lembrar o momento exato que passei de garota freestyle modernete da CPTM à funcionária do mês da Linha Verde.

Mas porra, que vontade de comer o cachorro-quente da dona Ana.

nes_ste
Enviado por nes_ste em 21/09/2011
Reeditado em 22/09/2011
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