Confissões à amada comprometida

A noite era tal que o brilho das estrelas bastava para iluminar o romântico restaurante italiano em que os três encontravam-se...

Mas tais luzes não brilhavam tanto para o companheiro que convidara o casal de amigos para com ele jantar naquele dia... E isto logo ficou explicito tão só afastou-se dela seu parceiro, namorado, deixando por eternos poucos minutos o anfitrião e a bela dama.

De algum modo, por todo instante em que se afastara dela seu parceiro — e mesmo nos instantes em que estavam juntos — parecia conter-se ela ante aos olhos daquele amistoso rapaz que a convidara em conjunto a seu enamorado. Por sua vez, o jovem amigo do casal olhava-a sem que ela o percebesse, mas não com sede de sua carne, não com fome de seu corpo divinamente concebido, mas com vontade de sua alma, de seu sorriso, seus pensamentos... Ele estava atraído pelo coração daquela moça, e não poderia ser pior...

Não tardou para que o apaixonado anfitrião, agora então sem poder ver mais ninguém senão a jovem, e sem ver tempo algum senão aquele, chamando-a então sua atenção a ele contemplasse-a ao declamar espontânea e suavemente:

"Então foram esses os olhos que sempre procurei?...

Imaginava-os coloridos pela vida, assim também como imaginei-os profundos... Mas não... Você me surpreendeu trazendo em tão doce face olhos que dão cor a própria vida, me surpreendeu, fazendo rasa qualquer profundidade com a penetração infinita deste seu olhar..."

Tão logo apontou ela seu coração ao dele buscando ali, nos olhos do rapaz, a pira ardente que o encarnava, desviou ele sua visão ao chão... Parecia se ver ali caído. Como se num lapso consciente, resgatando-se a si mesmo da total combustão de seu coração em apaixonada chama, entonou em tom mais cinza:

"A vida desvanece incolor após o contato com sua luz, portadora de todas as cores... E é difícil não cair entristecido com o fato de você ser apenas uma, como a breve vida de nossas almas..."

Parecia ele indiferente... já havia voltado ao seu estado inicial quando então o parceiro da moça retorna, abraça-a e a beija carinhosamente.

Como se quase nada houvesse acontecido flui assim a noite daqueles corações: um ingênuo, um surpreso e pensativo, e um enjaulado pelo crime da ingrata paixão...

O anfitrião sabia da tamanha dor que sentiria seu amigo, amado por sua amada amiga, e justificava toda a sua forçada indiferença em seu medo de causar esta dor... Reprimia-se como um grande amigo do casal, e por eles, fez de si carcereiro de sua própria paixão.