UM AGRADECIMENTO PÓS MORTE.
_Muitos acontecimentos marcaram a minha trajetória até os dias atuais, porém nesse momento, um em especial me vem a mente, todavia, farei uma pequena narrativa, para por em ordem as minhas memórias.
Quando eu tinha entre cinco e seis anos, meus pais se separaram, eu então passei a dividir o meu tempo entre a casa de "mainha", onde de fato morava, e a casa de "painho", que na ocasião morava com D. "Tiêta", não a do agreste romanciada por Jorge, nem a cantada por Luiz, muito menos a luz de Caetano, a Tiêta que aqui me refiro, tinha bigodes, vivia mastigando algo que eu nunca vi, faltavam-lhes quase todos os dentes,seus longos cabelos viviam emaranhados numa trança, mal trançada,movimentava-se com dificuldade, pois sofria de reumatismo.
Tinha também a D. Biu, essa veio morar com os dois bem depois, era completamente cega,mas catava feijão melhor que eu!
Estranhamente essas figuras não me punham medo, e estão nas minhas lembranças, mais do que a minha avó materna a unica que conheci.
Os três se ajudavam como podiam, aos meus olhos de criança, era o meu pai, e duas "velhas cachimbeiras".
O tempo foi passando enquanto eu ia vivendo as aventuras infantis...
... Eu acabara de fazer 15 anos,e fui passar o fim de semana na casa da minha amiga Cibele, painho, não estava muito bem de saúde, porém a casa da Cibele era no mesmo bairro onde o meu pai morava e eu pretendia visitá-lo, ainda naquele fim de semana.
A casa da Cibele era uma das melhores da redondeza, não era apenas um barraco de "tauba", era uma casinha de tábuas, pintada de azul e com divisões: Terraço, sala,quarto, cozinha,banheiro e um pequeno quintal,Cibele morava com os pais e o irmão Jorginho. Todas as vezes que eu dormia na casa da "Cibe", dona Mariana e seu esposo dormiam na sala, assim, eu Cibe e o Jorginho dividíamos a cama de casal, como Jorginho tinha apenas três anos ficava no canto da cama. Então eu e a Cibe nos danávamos a contar estórias de trancoso e "malassombros".
Era uma vez um amarelo "Veio"... Era uma vez uma gata "borralheira"...
O sol ia alto quando dona mariana me acordou com carinho de mãe: _Vera, ô vera, levanta filha, tem uma moça lhe procurando, parece que seu pai não está muito bem...
Despertei, me arrumei as pressas e fui para a casa de painho, lá chegando encontrei a casa cheia e Tiêta chorando enquanto a vizinha tentava em vão acalma-la. Dona Biu a um canto em silêncio, desfiava um rosário, painho na cama inerte. Tiêta acordou e ele não.
Eu já andava com a cabeça cheia de indagações, sobre a morte e o que a gente encontra depois dela, e o que vou lhes narrar agora contribuiu de maneira extraordinária para as respostas, que encontrei três anos após a "morte" de meu pai.
Sete dias se passaram quando resolvi visitar as duas companheiras de velhice do meu pai. A manhã mal havia começado. Encontrei Tiêta aos prantos, e a vizinha tentando lhe consolar, dona Biu também chorava. _ Oxente! O que aconteceu? Perguntei.
_Teu pai menina! Veio agradecer a Tiêta.
_Veio como? Queria saber.
_Ela estava deitada e ele ficou de pé perto da cama.
_Ah! taaah ela sonhou.
_Ela "tava" bem acordada e já ia se levantar!
_E o que ele disse?
E Tiêta entre um soluço e uma fungada de nariz, respondeu:
_Ele balançou a cabeça sorrindo, estendeu a mão e sumiu.