VIAGEM DE TREM
VIAGEM DE TREM
Crônica – autor: Carlos Freitas
Após curtir três dias em BH, reencontrando tios e primos, estou na Estação Ferroviária Central. É manhã de domingo. Na capital mineira, são 7h30’ do dia 15 de março de 2009 – hora da partida, num confortável vagão com ar condicionado. Pontualidade britânica. Um longo apito e, o trem ensaia os primeiros movimentos da longa jornada, rumo a Vitória/ES. Meu destino é a cidade de Timóteo, vale do minério, interior mineiro, vizinha de Itabira, berço do poeta Carlos Drummond de Andrade. Num vagar modorrento, a locomotiva, dá a impressão de que tem dúvidas quanto à sua capacidade em arrastar os vagões a ela confiados. Lentamente vai deixando para trás, a capital, periferia e municípios. Mais confiante na sua força, aos poucos, ela começa a engolir a distância, permitindo que nossos pensamentos fluam com saber e sem pressa. A viagem começa a oferecer aos olhos, belíssimas paisagens emolduradas por elevadas pontes, matas, riachos, rios, vales, mananciais, grotões e montanhas, ora verdes, ora rochosas, com um sereno céu azul a protegê-las e a lhes dar magia. Essa visão singular permite que eu sinta na alma, a grandiosidade desse elenco de obras perfeitas e majestosas, graciosamente nos dada pelo Criador. Contemplo vastíssimas áreas ainda protegidas por matas compactas. São faunas, floras, fertilidade e riquezas inexploradas, e concluo: - não deveriam existir tantos pobres e miseráveis sem tetos, a vagar pelos grandes centros, passando fome e necessidades de toda ordem.
O trem reduz sua velocidade. Vai chegando a uma estação. É domingo. Os passageiros descem e sobem sem atropelos. Talvez, por saberem que já não adianta mais correr. Provavelmente não tenham finalizado ou conquistado o planejado, e daí concluído, que pressa agora é inútil, já que ninguém consegue mesmo, mudar o destino ou o rumo do que está escrito.
Outra vez em movimento. As curvas se sucedem. Do mezanino, hipnotizado pelas paisagens, vejo os últimos vagões, os quais, dão a sensação de que impacientes, querem atropelar os que vão à frente. Minha máquina vai registrando belas imagens. Os olhos fixos nos paredões rochosos pelos quais passamos agora, mais velozes, proporcionam imagens desfocadas e surreais, tal qual, uma película rodada em velocidade acelerada. Sucedem-se vilarejos com suas igrejinhas, lugares sagrados, fontes de fé, onde certamente o povo humilde e sofrido, principalmente nesse dia vai em busca da proteção divina, e clamar por forças que o ajude a superar os percalços e desafios, para os incógnitos dias futuros. No domingo vindouro tudo se repetirá, dando continuidade à vida. As esperanças não sucumbem jamais. Outros vilarejos, em meio aos vales, dão-me a impressão de estarem desgarrados da civilização. Devem ter um ritmo de vida muito parecido ao do continuo e sonolento vagar do trem, obediente ao que lhes ordenam os trilhos, e sem alternativas, que lhe permita vislumbrar oportunidades e possibilidades de novos rumos.
Nesse momento de introspecção percebo que muitas vezes, inconscientes ou não nos tornamos escravos de uma vida fútil, sem emoções, sem desafios, sem crenças, sem certezas, sem metas, sem destino, sem forças para lutar, sem garra, sem brio e sem coragem. Sem amores na partida, ou amigos na chegada. Sem alegrias ou frenesis de felicidades sejam eles, românticos, familiares ou pessoais. Sem novas rotas, inexistirão novos horizontes.
Então, divago:... Se libertos dessa cegueira, agirmos, descobriremos o poder da conquista, do comprar, do gastar, do sorrir, do chorar, do festejar, do compartilhar, do amar e do sermos amados. Finalmente um dia realizados - poderemos comemorar. Porém, se ao invés de lutar, estagnarmos, seremos como as belas e impassíveis paisagens, que decoram e margeiam os trilhos do trem da nossa vida – vivas, simpáticas, graciosas, e até notadas, mas... passarão. Nossas faces ou nomes? - Nem ao menos serão lembrados.
Literalmente seremos iguais a um trem – Fomos notados ao passar, porém, não fincamos raízes jamais!
Não permita que a estrada da sua existência, seja comparada à dos trilhos de um trem. Terás pela frente, um caminho único, sinuoso. Um fim previsível. Uma vida inócua - sem alternativas, criatividade ou desafios!
São exatas 12h00'. Acabo de chegar à estação de Timóteo – Acesita, onde Milton. meu primo e anfitrião - me aguarda. O trem, seguirá o seu destino. O meu por ora é aqui. Além de BH, faz parte do meu roteiro, as cidades de Ipatinga, Mariana, Ouro Preto, Gesteira e, minha terra natal Ponte Nova.
Tenho ainda pela frente, estradas de terra e asfalto, que me levarão, ao encontro de parentes, alguns - não vejo há décadas. Serão muitos abraços, muitas histórias prá se ouvir e contar. Viver fortes emoções!
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NT. Um desses parentes que reencontrei depois de mais de 50 anos, meu tio Paulo, infelizmente faleceu. Era alguém muito querido que acabei revendo antes que partisse.