Cápsula

Se apoiou à janela do quarto do seu apartamento. Podia ver a lua, mas preferiu olhar pra baixo.

Vistou o que se passava pela rua e pode ver um grupo de jovens aparentemente embriagados, com seus cigarros nas mãos, espalhavam-se pela calçada. Sem pudor de alegria, sem pudor de viver uma vida controversa.

Suas tatuagens podiam falar por sí próprias e se ele conseguisse enxergar os desenhos coloridos da altura da janela, saberia um pouco mais sobre a personalidade de cada adolescente.

Com uma postura insensata, eles gritavam músicas às janelas e às portas das casas, incomodavam a vizinhança. Chamá-los de delinquentes pra ele, que via tudo de uma janela alta e podia usar de sua superioridade e mais idade para julgar, seria fácil, talvez pudesse arriscar até um cuspe em direção da calçada.

Porém, em vez de cuspe, em vez de sangue, desceu uma lágrima de seu rosto.

Passou a mão na camiseta de manga longa, que deu lugar a um passado similar, uma tatuagem de uma mulher ao lado de uma janela, com o escuro das frestas a esconder a infâmia de estar despida.

Lembrou de uma noite de embriaguez que cantou seu blues favorito numa portaria de edifício, lembrou de sua antiga e, morta felicidade.

Por todos esses anos, sua tristeza o trancou em um quarto de apartamento. E a cada noite, ele está se limitando a ver a vida alheia pela janela, se inclinasse mais um pouco as costas, talvez veria seus vizinhos fazendo amor.

Não era fácil entender o holocausto de sentimentos, a dor, a febre, a depressão.

E não fez esforço para entender, até considerou a possibilidade de suicídio, destiu como sempre.

Fez como todas as noites, pegou seu copo com água, pôs uma cápsula do anti-depressivo na língua, bebeu, e esqueceu do barulho da rua em dope de tristeza.

Porque enquanto uns usam da droga para se divertir, outros usam para esquecer.

Lucas Mezz
Enviado por Lucas Mezz em 13/09/2011
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