CINEMA
O cinema conceituaram-no como uma impressionante fábrica de sonhos. A minha geração, por sua vez, amou-o perdidamente.
Idos de 1958. O bairro onde morávamos dispunha de três cinemas. Os filmes geralmente em preto e branco eram produzidos maciçamente nos EUA; poucos europeus e menos ainda os nacionais. Exibiam duas sessões noturnas de 2ª. a sábado; aos domingos, matinês às 14:00 e duas sessões às 18:00 e 20:00h.
O público prestigiava. Para certos filmes, --- e não eram poucos ---, as filas se alongavam em volta do cinema, chegando a outro quarteirão; quando não, ficava gente para o dia seguinte. No terceiro domingo de cada mês um deles exibia, pela manhã, o festival Tom & Jerry para o delírio da meninada.
Fenômeno sócio-cultural de extremo poder influenciador, o cinema foi instrumento que ditou comportamentos inocentes e naturais em todas as faixas etárias: simulação de tiros em perseguições a bandidos, cruzamentos de paus imitando espadachins, modo de trajar, bordões de comédias nacionais que passavam a compor as conversas etc, senão, outros nocivos tal o vício de fumar. Era charmoso imitar os artistas fumando, praxe repetitiva nas cenas.
O condicionamento era tal que se percebia um sentimento generalizado de ódio ao pele vermelha escalpelador seguido de emocional simpatia pelos heróicos cara pálidas conquistadores. Ledo engano. Quão longe estávamos de entender que a história, naturalmente contada pelos vencedores, tinha forte viés favorável a eles próprios, distorcendo deliberadamente os verdadeiros fatos. (Meus tardios respeitos aos valorosos chefes Touro Sentado, Cavalo Doido, Gerônimo, Cochise, Alce Pequeno e tantos outros).
Tenho para mim um momento em que as imitações grotescas que o cinema proporcionou correram fartas. Não titubearia em dizer: vi-o com a célebre música de Malcolm Arnold. As pessoas, aos bandos, marchavam duras, batiam continência à moda dos militares e prosseguiam assoviando a música.
Quem não se lembra da Ponte do Rio Kwai?