A arte de desnudar-se
As asas do albatroz são longas e finas e necessitam de um espaço amplo para alcançar velocidade e decolar contra o vento. São desajeitados e lerdos no chão, mas nos céus esbanjam graça e imensa beleza.
Sonia Sancio Lóra
Há poucos dias uma pessoa me perguntou quando ela seria capaz de despir-se nas letras, como eu faço. Antes de ser um estilo de escrever, torna-se difícil a confecção, tal objeto de arte, de um texto ou poema sem o meu modo especial de amar. Mais difícil ainda é colocar a inspiração para descansar – porque ela também necessita reciclar.
Meu pensamento é sempre muito vívido e até das fantasias que ainda experimento, faço com que alguma realidade seja inserida. Apagar de minha mente experiências vívidas é tarefa impossível, pois são elas que guiam as minhas mãos ao escrever. Ao contrário de muitos escritores da atualidade, que escrevem através de programas de computador e, mesmo alguns do passado recente, que faziam uso da velha e boa máquina de escrever, eu uso lápis com borracha na ponta e apontador.
Depois, quando repasso o texto, vejo como a minha mente divaga em alguns trechos e em outros alço um vôo que nem jato supersônico. Alternando-me num planador leve e colorido ou num pássaro voando livre, aterrisso esborrachando-me, aos trancos, não sem antes passar por turbulências que quase me colocam a nocaute. Na maioria das vezes realizo o vôo do albatroz, uma descoberta que Charles Baudelaire (1821-1867) já havia sentido há muitos anos. Quando não consigo escrever o que eu realmente sinto e não gosto do resultado, vai pro lixo e não insisto no assunto, pois bem sei as minhas limitações.
Muitos anos se passaram para que eu assumisse que sou a pessoa mais importante para mim. Mas o passado... Este ainda me persegue com a força de um vento forte. A vida foi fada boa, mas também bruxa feia. Não existe no mundo um medicamento sequer que me faça esquecer o que me marcou em algum momento de minha vida.
Hoje demoro mais para dormir porque me dou a oportunidade de pensar em possibilidades e acordo com vontade de virar planador. O meu coração continua adolescente e o tempo, este bruxo ingrato, fez com que eu criasse outro coração, obedecer ao coração dos outros e ir percorrendo o caminho do albatroz, desengonçado, até encontrar um equilíbrio para a minha eterna busca de sorrisos verdadeiros.
Todos os caminhos, sem exceção, têm um começo e um fim. O meu estagnou no começo. Eu quero descobrir segredos, ficar abraçada bem quietinha e sentir as batidas daquele outro coração que eu tanto espero. É o passado trazendo-me para um futuro que bem sei que não será realizado, pelo menos agora.
As pessoas preferem sofrer, abrir mão de seus sentimentos, a viver as emoções do albatroz, que mesmo cuidando de seus filhotes, sai em busca de si mesmo no seu céu.
Domingo de setembro, 2011 e sol brilhando.
Imagens :Arquivo pessoal e Google Search