Vestibular
Quem diz que o vestibular da FUVEST é uma maratona não sabe ao certo o que diz. É uma mistura de maratona com triatlo, fórmula um, olimpíadas e não sei mais o quê de competições esportivas, com todos os desgastes que elas acarretam. É uma experiência única e inesquecível.
Primeiro, há os intensíssimos treinos, durante um ano inteiro – ou mais! É acordar cedo e tomar café da manhã com as Leis da Dinâmica ou de Lavoisier, revisando algumas regras gramaticais e, porque não, um pouco de logaritmos. Aí, vem a Revolução Francesa, o entre-guerras, intercalado de análise sintática e química orgânica, só para balancear os estudos. Inglês, of course, não pode ser negligenciado, afinal, são oito preciosos pontos na primeira fase.
Depois vem o almoço, regado a soluções e equilíbrio químico, sem esquecer das substâncias simples e compostas, principalmente a água (ou simplesmente H2O). Mas o prato principal é Geometria: bife triangular, trouxinhas retangulares de legumes, tomates em círculo e bolinhos elípticos de arroz. Sobremesa: frutas, que podem ser bagas ou drupas. A probabilidade de tudo isso dar uma indigestão é diretamente proporcional ao aumento da população, que cresce em progressão geométrica.
Durante a tarde, continuamos os treinos: baterias de testes para revisar e gravar o que foi estudado. Cinco acertos em vinte?!? Tudo bem, amanhã tem mais.
No jantar, é preferível algo mais light, para não ter pesadelo. Pode ser uma das leituras obrigatórias, Os Lusíadas, por exemplo (pelo menos será um pesadelo épico, em grande estilo). Dormir umas quatro horas por noite é um luxo inevitável, já que ninguém é de ferro (nem de ouro, cobre, níquel, urânio, titânio, ...) Meu Deus, o que é mesmo fissão nuclear? E o Congresso de Viena, Tratado de Versalhes, características do clima tropical de altitude, Leis de Mendel? Como guardar tudo isso?
Bem, esta é apenas uma parte da competição: uma prova de resistência física, mental e psicológica. Ao longo do ano, os amados e terríveis simulados. Amados, porque dão uma idéia de nosso preparo em relação aos demais candidatos. Terríveis, pois nunca conseguimos o número de acertos necessário – ou pretendido. E a redação? Ah, a redação! Será que saí do tema, terei usado corretamente a coletânea, o texto ficou coeso? Vem o resultado: precisa melhorar a pontuação, não use clichês, utilize parágrafos mais curtos, olhe a coerência!
Chega o dia da primeira fase: corrida contra o tempo, para responder cem questões, e contra os outros 145.000 candidatos. Só? Não! Essa prova exige que tenhamos os reflexos do piloto de fórmula um, o fôlego do triatleta e a paciência do enxadrista. Cansaço, calor, sede? Tudo isso é luxo, completamente dispensável, no momento. O importante é vencer, afinal, a nota de corte não perdoa. Agora é esperar a convocação para a segunda fase, enquanto reforçamos os estudos nas matérias específicas. Na dúvida, estudar!
Sai o resultado: vemos nosso nome na lista e não sabemos se rimos ou choramos. Ou melhor: rimos e choramos ao mesmo tempo. É uma injeção de ânimo para a finalíssima – as provas dissertativas da segunda fase. Início de pânico: em menos de trinta dias, é impossível rever toda a matéria. O jeito é selecionar alguns itens e pedir ao Todo Poderoso que nos faça lembrar de tudo na hora da prova. O tempo voa. Tem Natal, Ano Novo, e, finalmente, chega o dia.
Saímos das provas com a sensação de não ter feito nada certo, as questões eram muito abrangentes, exigiam total concentração e paciência infinita, sem descuidar da letra e do espaço restrito à resposta.
Agora, nada mais a fazer, a não ser esperar. São 28 dias, a Lua dá uma volta completa ao redor da Terra, vagarosa, indiferente à nossa ansiedade. Não dá para acelerar a Lua? Não dá! Podemos tentar driblar o sofrimento, fingir que nada está acontecendo. Mas como, se nesse exato momento o corretor pode estar com nossa prova nas mãos, decidindo nosso destino?
Finalmente, chega o grande dia. Vai sair o resultado, mas só à meia-noite! Pode existir algo mais terrível do que a expectativa crescente desse último dia? Bem, podemos tentar dormir e saber no dia seguinte. Mas quem consegue?
Ao vermos nosso nome na lista, a sensação é indescritível: um misto de poder, alívio, aumento da auto-estima e sentimento de dever cumprido. Agora é só enfrentar o trote e, depois, quatro ou cinco anos de graduação; aí vem a pós graduação, o doutorado, o pós doutorado, e o que mais inventarem.
Em matéria de estudos, o céu é o limite!