Sobre estradas e sonhos

Ontem vi Easy Rider (1969), traduzido no Brasil como Sem Destino.

Ao pé da letra, a tradução seria: motorista fácil ou rápido. A história fala de dois motoqueiros que, apesar dos títulos, não dirigem tão rápido assim e não dirigem sem destino: pelo contrário, eles atravessam o Estados Unidos de maneira lenta, aproveitando a paisagem, em direção á Nova Orleans, onde pretendem se esbaldar no seu tradicional carnaval.

No caminho encontram rancheiros hospitaleiros, comunidades hippies e cidades interioranas, além de um advogado muito inteligente, mas que tem problemas com bebida.

Dois personagens que estão nos acostamentos dessa história e volta e meia tornam a aparecer são o preconceito e a liberdade. A dupla de motoqueiros, tendo a estrada como sua morada, são arautos da liberdade, sem se darem conta disso. Enquanto os "caipiras quadrados", na expressão do advogado beberrão, representam o outro personagem. O preconceito que surge da indiferença, da inveja ou do ódio.

A impressão que se tem é de que os EUA conhece essas figuras há muito tempo: afinal, o racismo e a relativa autonomia de que desfrutavam os colonos fundou esse país. Na sua viagem, estes dois andarilhos vêem isso muito claramente. Em algum momento, novamente parafraseando o advogado, esse país mudou, para pior.

A época em que Easy Rider foi feito era um momento de mudanças. Guerra do Vietnã, Woodstock, Movimentos pelos direitos civis dos negros. Tudo isso estava acontecendo ao mesmo tempo. Quem era jovem vivia no dilema de querer sair daquele espírito sufocante de conservadorismo e encontrar algum caminho onde fosse mais livre e feliz. Eles conseguiram? A geração que queria mudar o mundo tinha seus próprios demônios, como podemos perceber na angustiante cena em que os protagonistas e garotas de programa se drogam num cemitério. Alguns partiram para autodestruição, outros mudaram de lado e muitos foram "atropelados pelo rumo dos acontecimentos".

O filme termina (me perdoe quem nunca viu, mas tenho que contar o final) com essa conclusão: o sonho acabou. O preconceito, o conservadorismo, os "sistemas antiquados" ganharam. Nossos protagonistas morrem na estrada que tinham como lar. A desilusão com o mundo, após perderem seu colega advogado, é selada com o seu próprio fim.

Easy Rider é a crônica de uma geração.