Coisas do passado
Quando tecnologias são ultrapassadas, condenamos o que é obsoleto à extinção. O Blu-Ray tem se popularizado e, com facilidade, fazemos download gratuito de filmes pela internet. Os sons automotivos deixaram de lado os CD e DVD e passaram a adotar a entrada USB. O resto é antiguidade. Em casa, basta conectar o computador a caixas de som potentes e as músicas serão tocadas diretamente do PC. No passado, era necessário gravar um CD de mp3 para ouvir e, antes ainda, um CD de áudio. Para não se falar das fitas K7, do disco de vinil e dos rádios a pilha, relíquias que servem para exposição.
Além disso, a evolução fantástica dos computadores substituiu os trambolhos volumosos por máquinas mais compactas e potentes: dos computadores de mesa para os notebooks, netbooks, palmtops e tablets. Lembra-se dos mimeógrafos? Grande parte das escolas deixou de utilizá-los e passou a adotar o projetor multimídia como ferramenta auxiliar de trabalho.
Mesmo com essa gama de novidades eletroeletrônicas, os equipamentos antigos resistirão ao tempo. E quem aposta na sobrevivência, apenas, das novas tecnologias, demonstra uma visão muito parcial da realidade. Não conhece o mundo ao seu redor ou, então, não faz questão alguma de sair do seu sofá elitista e olhar para os lados.
Essas evoluções, muito bem-vindas por sinal, chegaram e facilitaram a vida. Deixaram as ações mais dinâmicas. Podemos conectar-nos ao Orkut e Twitter pelo celular ou achar qualquer ponto numa cidade desconhecida com facilidade através do GPS. Contudo, as inovações tecnológicas não são acessíveis a todos, porque boa parcela da população recebe um salário que mal paga o alimento. Terão condições de adquirir um bem desses? Não há boas perspectivas para isso.
Na crônica “Escrever à mão” de 17 de julho, no Caderno Donna, do jornal gaúcho Zero Hora, a colunista Martha Medeiros sentenciou que, em breve, ninguém mais usará cadernos, e sim, tablets. Canetas, lápis e apontadores serão artigos de museu e, possivelmente, substituiremos os livros impressos pelos e-books.
Acreditar que toda a população terá condições de comprar um tablet para usar como caderno é ter uma visão muito simplista. É ilusão das grandes crer que as escolas evoluirão ao ponto de excluírem os cadernos e adotarem, apenas, as mídias digitais. Quem sabe daqui a mil anos... Eu gostaria muito que essa integração com as tecnologias ocorresse nas escolas nessa intensidade, porque já há muito tempo deveria ser realidade, mas estamos muito aquém do que fantasiou a cronista.
É impossível imaginar uma escola de última geração se há poucos professores capacitados para trabalhar com computadores e afins e os recursos financeiros mínimos previstos na constituição nem sempre são cumpridos pelas autoridades. Apresenta-se improvável o amplo uso das tecnologias, pois os problemas da educação são vários, as soluções, complexas e devem ocorrer em conjunto com os demais setores. E não é da noite para o dia que se chega a um resultado positivo. Depende de políticas públicas que, dentre outros fatores, diminuam as desigualdades sociais.
É fácil se enclausurar numa redoma de vidro, num mundinho perfeito, bem parecido com o nosso. Porque a pobreza é algo feio de se ver e sentir. Muito mais conveniente crer que todos comprarão tablets quando o preço baixar de atuais R$ 900,00 (os modelos mais baratos) para R$ 200,00. Acreditar nisso é ser como o protagonista Jimmy, do filme “Jimmy Bolha”, que, por ter o sistema imunológico debilitado, vivia numa bolha de plástico, sem contato com os ares impuros da realidade. De lá, imaginava e vivia o seu mundo de acordo com o que supunha ser o real.
Não é inusitado ver alguém ouvindo música ou jogo de futebol em radinhos a pilha. Nas escolas, o mimeógrafo já deveria ter caído em desuso há vários anos, mas permanece sendo utilizado, concomitante à fotocopiadora e ao projetor. Se eu fosse apostar na longevidade do mimeógrafo ou na disseminação dos tablets nas escolas, não teria dúvidas em apontar a prevalência do primeiro. É uma triste constatação, mas é real.