FOTOGRAFIA DE UM LIVRO
Aquela cidade com pontes e catedrais antigas deixavam o sol assim ofuscado, quando ele aparecia nos alegres dias de verão. Mas nesses dias cinza que se seguiram era como se dentro de um cartão postal de calendário. Junto ao rio, árvores com galhos esticados, folhas largadas pelo chão, chapéus emplumados em cabeças femininas com vestidos elegantes nos corpos finos; mãos enluvadas. Velocípedes com garotos quase ainda lactentes pedalando, vigiados de perto por gordas babás em babados brancos, e suas mães ocupadas com suas luvas. Com grande tédio do mundo já. Embora tudo fosse cinza ainda havia aquele mundo, um verão claro mais tarde, nuvens de chaminés bem longe; embora gente triste e mal vestida atravessasse a ponte sem olhar para o rio, cansadas, carregando sacolas enormes vindo dos mercados, das feiras populares, e nem podia pegar o bonde. Mas fingiam-se felizes, satisfeitas de viver, e nos parques e praças tudo parecia funcionar congelado ou fotografado como uma pintura antiga, de uma lembrança longínqua, de alguém que não teve idéia de como foi viver.
Mas sempre nos despedimos, tristes ou satisfeitos com cada era, com cada tempo, encontrando motivos e planos que nos fizeram chegar ao fim, esperando, ansiando para o nunca-fim, mas ao afinal conformados, apaixonados, sozinhos e esperançosos, guardando na nossa solidão mais intima o nosso mais terrível segredo contra essa própria vida que tanto amamos e continuaríamos a amar.
Rodney Santos