SENHOR DO TEMPO

Escutei há anos atrás numa aula de filosofia que o tempo não existe e tudo não passa de uma invenção humana. Ouvir aquilo me levou a outros pontos sobre nossa existência: dizer que nós criamos o tempo foi fomentar a certeza de nossa pequenez, das dificuldades que teríamos para viver e compreender nossa existência inserida num tempo e espaço se não houvéssemos criado o tempo. Estou escrevendo tempo na letra minúscula de propósito, porque quero diferenciar da idéia do outro Tempo, agora com maiúsculas, que nos leva diretamente a noção de Deus.

Nesta mesma aula ouvi que Deus é um Ser atemporal, ou seja, um Ser que vive fora do tempo, que não precisa das horas, dos dias e nem de um espaço para se localizar ou dimensionar. Talvez por isto tenhamos tanta dificuldade de nos comunicarmos com ELE, sempre queremos e esperamos que nossos pedidos acontecessem dentro de certo tempo, geralmente para ontem, e de certa medida. Assim a comunicação ficará sempre truncada e frustrada na resolução. Então também aprendemos que ELE sabe das nossas necessidades muito antes de nós mesmos; tomar consciência das próprias necessidades já poderá ser meio caminho andado entre nós: ELE e seus filhos mortais.

O Senhor do Tempo pode ser suave, conciliador e abundante na sua infinita bondade, mas hoje parece que estamos distante de compreender isto. Hoje a riqueza da pessoa é pelo que pode contabilizar na conta bancária e outros fatores mais. Rico é o que tem, enquanto outro que privilegia o ser já não sabe mais o que fazer para estar neste mundo efêmero. Resultados são os desencontros marcados profundamente pela linguagem das conquistas no aqui e no agora. Amanhã poderá ser tarde.

Quando criança ouvia dizer que antigamente as coisas eram difíceis, mas tinha um gosto doce sobre as conquistas. Hoje parece que não temos tempo de reconhecer as conquistas porque logo estamos nos preparando para outras. O exemplo disto são os jovens que saem da Graduação universitária e logo engajam numa pós-graduação porque o diploma de graduação já não é mais suficiente para eles conquistarem o mercado profissional. Lamentável essas proposições, porque algum bom tempo passado descobria que só conseguíamos aprender o sentido de todas as informações que prestaram nos bancos da escola quando saímos para a vida do trabalho e do exercício da profissão.

Não estamos negando a importância da evolução do tempo, estamos apenas questionando para onde nos leva tanta evolução, se em nossa constatação dos fatos as doenças mentais estão disseminadas cada vez, trazidas pelos rastros das angustias da existência e da morte, pois estão presentes em cada passo das pessoas afligidas mentalmente, afligidas na alma. Transtornos e distúrbios mentais que não escolhem raças e nem o valor da conta bancaria. Sim, alguns mais afortunados podem pagar as consultas particulares e outros não, mas ambos vivem mergulhados nas dificuldades de serem felizes no contexto do próprio tempo de cada um.

Só conseguimos questionar essas alterações do humor, das condutas humanas observando o grau de intensidade e insistência com que estão sendo acometidas as pessoas cada vez mais e cada vez em idades precoces: crianças, jovens, adultos e idosos sofrendo com as mudanças nas condutas do tempo. Enquanto isto o Tempo passa-nos alheio a tudo isto: a Efemeridade das relações e das conquistas em busca do bem estar.

O Senhor do Tempo é em si a não ocupação dele, tempo, mas como mortais que somos precisamos do nosso tempo para dimensionar nossa existência, mas pode ser que tenhamos que rever a qualidade de todas estas coisas que buscamos como produto final para nossa vida mental, espiritual e corporal.

Graça Costa

Amparo, 08/2011