Shakespereando na web
Registros do romance virtual entre Romeu Silva e Julieta Aparecida de Souza
ROMEU – Se com minha mão indigna, profano esse web santuário, é esta a gentil multa que me disponho a pagar. Meus dedos, dez envergonhados peregrinos, encontram-se prontos para enviar esse e-mail rude com um torpedo terno.
JULIETA – Bom peregrino, subestimas tua mão e a ela não fazes jus, que assim demonstrou respeitosa devoção. Pois os PCs têm teclas que se deixam tocar pelas mãos dos peregrinos, e o torpedo do navegador dá-se rede a rede.
Certo, certo... Este diálogo nunca vai existir, mas é que tento de alguma forma, pôr um pouco de literatura nesses romances virtuais. Conquistas e xavecos com tantas palavras abreviadas e frases mal escritas que nunca se chega a uma exata conclusão se é namoro ou amizade, deixando dúbia a existência de um romance. E ainda, nem levarei em conta a falta que faz para a concretização do romance: o olho no olho, o toque das mãos, a proximidade dos lábios e o descompasso de corações acelerados. Emoções essas que não se traduzem e não se extraem em redes sociais.
No entanto, não é necessário ser Shakespeare para enviar uma mensagem de amor, nem terminar em tragédia para enaltecer ou eternizar uma união, mas a banalização do romance pelos internautas chega a causar náuseas. É uma total falta de comprometimento com a linguagem verbal, e um descaso ainda maior pelo sentimento mais nobre, quando se digita “te amo” e enquanto esse sentimento flutua nas ondas até chegar à pessoa “amada”, se pode trocar o canal da TV, comer lanchinhos delivery, falar ao celular, checar emails. E os Don Juans modernos, sempre galanteadores conectados, ousam enviar a mesma mensagem para mais de um endereço simultaneamente.
Mais uma tentativa para Romeu Silva e Julieta Aparecida de Souza:
JULIETA – Os internautas não se movem, tens de concordar comigo, em consideração as redes.
ROMEU – Então não te movas, enquanto minha prece eu executo. Assim, enquanto meus dedos acariciam as teclas, meu pecado é absolvido.