POMBAS TONTAS
Seu Schroeder beirava os setenta anos.
A tarde era de entrada de verão. Ele já havia bebido umas cachaças a mais. Animado com a curiosidade dos que ali se achavam, começou a contar suas histórias do tempo em que era moço e trabalhava com navegação comercial por uma grande extensão da costa doce do Rio G. do Sul. E os barcos começaram a ser fabricados ainda no século dezenove por alemães que haviam colonizado o Vale do Taquari, formando várias cidades.
O velho lembrava os tempos vividos nos anos quarenta e cinquenta, andando livre pela costa.
- E vocês sabem, a gente ficava muitos dias nestas lides e aí eu sempre deixava uma cabine reservada no meu barco... pois a qualquer hora, disse, dando um sorrisinho safado, podia surgir... uma pomba tonta...
Eram muitos homens ali presentes e esta inesperada revelação deixou todo mundo eletrizado.
Neste momento ele cresceu de sua velhice um tanto alquebrada e acordou daquela vidinha modorrenta e sem nada que o fizesse ainda desejar estar vivo. Endireitou-se, ergueu mais a voz e já era um menino metido em animada tagarelice.
E lá se vinham as lembranças de sua juventude e do tempo de homem adulto e vigoroso. Vivera intensamente uma profissão cheia de mistérios para pessoas que vivem em terra firme. Um legítimo marinheiro de água doce e suas incríveis histórias que a sua fantasia, é provável, fizesse aumentar em colorido e detalhes mais atraentes.
Um dos guris estava ansioso desde a história da tal cabine, e aproveitou para perguntar, bem na hora que Seu Schroeder estava a narrar o dia em que foram surpreendidos por "piratas" saqueadores e fazia uma pausa para respirar.
- E aí, Seu Schoereder, e a tal cabine, e as pombas tontas?
Houve um silêncio de expectativa geral.
Ele parou, olhou para a frente, suspirou fundo. Seus ollhinhos um tanto apertados e de um azul intenso revelaram um brilho repentino e ele sorriu levemente.
Então olhou para o nada e respondeu filosofante:
- As pombas, ah... as pombas tontas... agora meus amigos, é só olhar e deixar VOAR ...!!!