O leve que é pesado e pesado que é leve...

O LEVE QUE É PESADO E O PESADO QUE É LEVE

Ninguém mais que Marilu gosta de curtir um domingo na beira do mar.

Sentada numa barraca rústica de um barzinho na praia ali está ela, apreciando o encontro do mar com o céu. Apreciando as ondas que às vezes forte beija a areia deixando marcas. Beijos às vezes babados e espumantes e outros leves e silenciosos que mais parece uma carícia. O mar fala, o mar reclama, o mar chora, canta, ronca e sussurra. O sol que doura o azul do mar é escondido pelas nuvens que parecem ter ciúmes de seus raios e tenta entretê - lo no manto azulado escondendo o clarão em formas variadas. Nuvens com cara de bichinhos, de anjo e de pessoas. O vento sopra, ora voraz, ora moderado. E como é bom senti – lo no rosto, nos cabelos, no corpo. Ora ele quer despir, assanhar, derrubar e ora é brisa, suave, dócil e tranqüilo, pensa ela.

De repente Marilu é interrompida em seus pensamentos com a presença de Daniel. Incomodando sem querer incomodar como bem disse ele, indaga a Marilu:

- Posso me sentar um pouquinho com você?

- Já tá sentado. Conta uma novidade boa aí, Daniel.

- Nada de especial. Estou aqui me divertindo um pouco. Olha lá aquela gorda. Como deve ser pesada!

- E aquele magricelo, aponta Marilu.

- Deve ser muito leve, completa Daniel.

- Você sabe que tem muito gordo que é leve e muito magro que é pesado?

Daniel sem entender bulhufas pede explicação. E Marilu explica:

Os gordos, por exemplo, têm fama de serem pessoas bem-humoradas, alegres, divertidas, portanto nem um pouco pesados. Sabe o que é uma pessoa pesada, Daniel? Vou dizer algumas maneiras de se identificar esse tipo de criatura:

1. Uma pessoa pesada é aquela que é chamada para vir comer um churrasquinho agorinha na beira da piscina e diz que não vai porque não aceita convite de última hora.

2. É aquele que perdeu um ente querido há dois anos atrás e ainda hoje chora sua ida.

3. É aquele que quando seu vôo foi cancelado por causa do tempo não se conforma, reclama , resmunga como se São Pedro pudesse escutá-lo.

4. É aquele que deixa de ir a uma festa porque queimou a roupa quando foi passar e fica irritado por vários dias.

5. É aquele que diz todos os palavrões possíveis e imaginários com o pobre do prego que rasgou sem querer sua roupa nova.

6. É aquele que confere no relógio o tempo do pedido e hora que o garçom serve.

7. É aquele que nunca acha uma piada divertida e que é difícil tirar dele um sorriso.

8. É aquele que nunca lhe presta um favor, mas está sempre lhe pedindo um.

9. O pesado é sempre polêmico. Só enxerga o que está na sua frente não abre mão do que julga como certo.

10. O pesado quando perde um grande amor entra no casulo para o resto da vida.

11. O pesado é comodista. Só faz o que lhe é conveniente.

Por sua vez “o leve”:

1. Aceita qualquer convite a qualquer tempo a qualquer hora. Está pronto para se divertir.

2. É aquele que sente saudade dos que já se foram para sempre, mas entende que a vida continua.

3. Quando o seu vôo foi cancelado curti um dia a mais no hotel grátis por conta da companhia aérea.

4. É aquele que tem sempre mais de uma roupa no ponto para substituir aquela planejada no caso de um imprevisto

5. É aquele que aproveita a roupa rasgada e põe um bolso, uns enfeites pra esconder a parte danificada e os outros ainda elogiam o novo modelo.

6. É aquele que aproveita a demora e incompetência do garçom para tomar umas cervejinhas e ficar mais animado.

7. É aquele que rir quando lhe contam qualquer piada embora já tenha ouvido centenas de vezes.

8. O leve está sempre disponível para o que der e vier. Adora ser solidário.

9. O leve abre mão de seus paradigmas, é moderno, inovador está sempre progredindo.

10. O leve quando perde um grande amor tem dias contados no casulo, depois parte para a vida, batendo asas como uma borboleta, colorida, cheia de vida na busca de um novo amor.

11. O leve é o oposto do comodista. Topa tudo e adapta-se a qualquer situação.

Chega Marilu, diz Daniel. Entendi tudo. Aquele esqueleto ambulante que está desfilando naquele minúsculo biquíni tem cara de pesado. Vê a testa franzida que ela tem. Deve pesar algumas toneladas.

E Marilu aponta um gordo barrigudo de cento e tantos quilos. O bucho pendurado no calção e as mamas mais fartas do que de muitas belas mulheres “ turbinadas”. Esse ai tem cara de levinho. Olha só seu rosto de alegria. Nem anda, desfila.

E os dois passaram o resto do dia na praia analisando os leves e os pesados. A maré encheu, chegou até a barraca, molhou os pés de ambos. O vento uivou, como querendo participar da conversa. As nuvens recolheram o sol e foi quando eles se deram conta que era hora de voltar para casa. E no meio do arruma, arruma, calça chinelo, põe a canga, guarda os óculos, Marilu lembra de perguntar. E você Daniel? É leve ou pesado?

Maria Dilma Ponte de Brito
Enviado por Maria Dilma Ponte de Brito em 11/12/2006
Reeditado em 10/06/2020
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