Um paraíso da música

A eterna volta dos que não foram: o grande barato do vinil

Um dos paraísos da música – e ao que me refiro no título – é a casa de meu amigo historiador e, de certa forma, pesquisador musical Marcelo Maia. O lance rola assim: o cara tem um arquivo digital de umas 50 mil músicas – ou sei lá quantas – em seu computador. Tudo num programa de computador tipo jukebox. Você, quando frente à maquininha para escolher suas músicas, demora minutos para sair da letra “A” na ordem alfabética dos artistas. A dinâmica da festinha musical na casa dele é baseada em, simplesmente, música, e pouco se fala em outro assunto. Um encontro de amigos amantes de música de variadas vertentes. A gente pega o mouse com a mão ligeiramente engordurada do churrasco e escolhe, cada um, uma seqüência. As mais ecléticas, surpreendentes e inusitadas, costumam ser as mais “respeitadas”. O que costuma causar um mal estar – discreto mal estar – é quando um cara como eu vai lá e programa uma seqüência de 10 músicas, o que é uma covardia. Já houve também aberrações como “quem coloca a música mais longa”, o que é pior ainda. Enfim... Aquilo lá é sempre uma grande festa. Pequena em número de participantes, porém enorme no coração de quem está presente.

Agora o problema da mão engordurada terá de ser, obrigatoriamente sanado, pois temos novidade: a nova onda por aquelas bandas do Santa Rita é o disco de vinil. E colocar vinil pra tocar, tem que ser com as mãos limpas. Estive lá na última sexta feira levando uns 8 quilos de vinil. Fui a pé do centro até a casa dele com duas garrafas de vinho argentino barato numa sacola de supermercado, e na outra mão a caixa com as bolachas. Cheguei lá exaurido. Mesmo estando moído, brinquei com ele dizendo que aquele era o pen drive mais pesado que se pode carregar (30 discos dão num pen drive e sobra espaço). O que eu levei? Ah... Levei meu duplo ao vivo do Jimi Hendrix; meu White Album dos Beatles; meu The Wall e meu Dark Side of The Moon do Pink Floyd (este ouviríamos com as luzes apagadas); levei o Dèja Vù de Crosby, Stills, Nash & Young – é, como estamos começando os trabalhos, nada mais apropriado que começar pelos clássicos. Levei também umas coisas que são muito “minhas”, como o Estrangeiro e o Totalmente Demais do Caetano; como o primeiro da Cássia Eller, quando ela era meio que uma cantora de jazz contemporâneo; o primeiro do Hojerizah (banda dos anos oitenta que poucos conhecem), que eu sei que é um dos melhores discos de rock já feitos no Brasil... E o que encontrei lá? Bem... o Juan levou Hotel California, do Eagles, que eu não sabia que era tão bom; levou um do Chico... O Marcelo tinha lá o Acabou Chorare, dos Novos Baianos; o do Luiz Melodia que tem Pérola Negra, Magrelinha, etc; uma porrada de discos de jazz... George chegou com as mãos abanando, sentou, bebeu e ficou impressionado com a “nova onda”. Ficou confuso com a capa do Álbum Branco, curtindo bastante tudo aquilo. Senti falta do Bruxo lá para dizer “cara, esse disco é muito louco”, talvez referindo ao meu Rainbow Bridge, do Hendrix. Bruxo é tatuador e é grande admirador – como eu – de Jimi Hendrix. Enfim, uma pequena rapaziada, muito boa e tranqüila, é freqüentadora dos encontros musicais no Marcelo. Então, agora é assim: a gente bebe vinho e/ou cerveja – na verdade, mais cerveja –, belisca alguma coisa bacana preparada pelo anfitrião ou sua mãe, e ouve um som antigo da melhor qualidade, enquanto discute música, olha pra baita capa do disco – que fica num pequeno “stand” em cima da mesa, junto aos copos e garrafas – ou contempla a densa mata que fica encostada na varanda do cara. Enfim, um grande barato.

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