Baixaria
Baixaria
A diretora da Escola Costinha do Brejo , situada num bairro muito populoso de São Paulo, após tomar conhecimento da problemática de uma aluna, chama um funcionário e determina:
- Cinqüenta e Um , por favor, vá até a sala 12 e convide Algodão Doce a comparecer aqui, pois esta menina anda brincando demais e vai muito mal nos estudos.
Cinquenta e Um meneou a cabeça como sinal de aprovação e foi cumprir o solicitado. Retirou-se do lugar onde estava e correu até a sala de jogos, para procurá-la, pois era hora do intervalo.
Subiu as escadarias, daquele imenso prédio , correndo pelo longo corredor,meio ofegante, alcançou a sala.
Parou diante do vitrô e observou se a jovem que estava entre os colegas , jogando xadrez , era ela . Reparou em todos e a reconheceu. Acenou com a mão pelo vão da persiana da janela, apontando com o dedo indicador , a um colega, que estava próximo, para chamá-la.
Assim que ela percebeu , passados uns minutos , veio atendê-lo e ele lhe transmitiu o recado: - A diretora Capuco está chamando você lá na secretaria .
Algodão Doce titubeou, mas desceu a escadaria , tremendo de medo , em direção à secretaria, passou pelo corredor e, aproximando-se da entrada , adentrou a sala principal, lentamente....sem pedir licença.
Dona Capuco, mal avistou a adolescente , foi logo soltando o verbo e pronunciou:
- Algodão Doce, se continuar dessa forma, você perderá a bolsa cidadã e eu não vou poder dar jeito. O PIB vai ficar no saco furado.
-Vou precisar de que sua mãe venha aqui na escola, para justificar o motivo de tanta falta. Só na aula de Ciências você levou 47 ,na aula de Português já somam 56, assim não vai dar certo.Seu aprendizado está muito prejudicado.Você só tem notas vermelhas.
- Não quero que aconteça isto, se não parar, terei de encaminhar seu caso ao Conselho Tutelar. E seus pais deverão ser responsabilizados.
Algodão Doce rebateu: - “Não, não Dona Caputo, não denuncie meus pais , eu vou melhorar, prometo que vou parar de faltar...
Continuou Dona Caputo:
- Cinquenta e Um , pegue este número aqui da ficha , ligue, por gentileza, para mãe de Algodão e peça para ela comparecer aqui na EMEF, o mais breve possível.
Imediatamente ,Cinquenta e Um obedeceu às ordens da gestora , pegou o telefone para discar o número indicado. Discou, ouviu o sinal começar a tocar e aguardou alguém atender o telefone .
Minutos após....
- Alô!
- Alô, quem é?
-Aqui é da EMEF Costinha do Brejo, posso falar com a Dona Sapopemba?
- “Diga lá, sou eu, o que manda?
- A senhora é a mãe de Algodão?
- Sim!
- Boa tarde, Aqui é o inspetor 51, da EMEF Costinha, a direção mandou comunicar a senhora sobre a necessidade do seu comparecimento urgente aqui .
- E o que é?
- Nada mais, nada menos sobre o que sua filha vem aprontando!
- Aprontando ? O quê!!!
- Lá vem chumbo grosso!
Tá bom, daqui a uma hora, terei que ir ao mercado comprar um pacote de arroz e darei uma passadinha aí. (Já vem essa escola me chamar à atenção de nooooovo!) Ai, Ai, Ai...
Como o intervalo tinha acabado, Algodão Doce foi conduzida à sala de aula, ciente de que teria um dia cheio de comentários a seu respeito, e cheio de ”lenga lenga,” com a posterior vinda da mãe.
- Por volta de 15 horas, o dia era muito ensolarado, Dona Sapopemba saiu de casa , querendo logo resolver o caso.
Após passar no supermercado e comprar o pacote de arroz, correu apressadamente , em direção ao local , pois ficava na circunvizinhança de sua casa.
Chegou à escola toda espaventada, transpirando pelas ventas, com o coração quase saindo pela boca.
Entrou pelo portão da EMEF, sem pausa para respirar...
Ao parar diante da secretaria , se identificou , falou que tivera recebido um telefonema, contou o caso e pediu para falar com a diretora.
A ATE foi comunicar à diretora que Dona Sapopemba estava presente, porém não a encontrou e passou todo o problema a Dona Tribufu , a outra Assistente, a qual se encarregou de verificar o caso e de conversar com a mãe.
Dona Tribufu mandou a auxilar pedir àquela senhora que entrasse na sala dela com o intuito de expor toda a situação.
Dona Sapopemba aceitou o convite e foi ao encontro da Assistente de direção. Mal entrou na diretoria , começou a gritar, dizendo que não tinha culpa de nada, que a culpa era dos empregados da Prefeitura que não sabiam trabalhar direito.Fez o maior escarcéu.
Tribufu tentou acalmar o ânimo acirrado da mulher e ofereceu-lhe uma cadeira. Ela aceitou, sentou-se e , após se acomodar, a gestora começou a narração :
- Dona Sapopemba, a sua filha esta abarrotada de faltas, será que não é por causa desse namorado que ela arranjou? Pois ela tem faltado demais na escola , e muita gente tem encontrado os dois juntos perambulando por aí... Muitos já a pegaram atrás do paredão no escuro, namorando.
- Até cheiro de bebida alcoólica, os professores já sentiram em sua filha!
Sapopemba respondeu grosseiramente:
- Olha , o que você está falando? Tá pensando o quê da vida ? Minha filha arrumou um homem bom , um homem que ajuda. Ele bebe , mas dá dinheiro!
Vocês ficam comentando sobre ela, vocês estão com inveja dela. Um homem como ele ,não é pra qualquer uma,não, só faltava esta história, agora, colocar a culpa no namoro da Algodão .Vocês são mal amadas.
Tribufu ficou perplexa diante da atitude da mulher e insistiu :
- Quantos anos tem o namorado de sua filha de 13 anos?
Respondeu Sapopemba:
- Ele tem 23 anos, e daí? Ninguém tem nada a ver com isso.
Indagou a direção:
-Então, senhora, qual o motivo das ausências de sua filha?
Afirmou a mãe:
- Assaduras nas partes de baixo, a menina estava toda ardida nas partes íntimas, como poderia vir à escola?
Insistiu a servidora pública:
- A senhora a levou ao médico?
Disse a mãe:
- Não.
A Assistente quis saber:
-Por quê?
Dona Sapopemba respondeu:
- Porque ninguém gosta de mostrar para os outros as suas vergonhas doentes , pra ninguém , ouviu?
- Minha filha estava sofrendo tanto , que não podia dar, sequer ,um passo, de tanto que as virilhas queimavam e ardiam , era muita dor!
- Agora que veio melhorar , depois que arrumou dinheiro e comprou pomada.
Ainda declarou a mãe:
- Quero pedir uma coisa : - Deixem de perguntar sobre a vida dos outros e ajudem mais a comunidade , senão quem vai quebrar o barraco sou eu e denunciar a senhora de ter causado situação vexatória contra minha menina.
- Esse benefício é o único que nós recebemos para comprar a cesta básica e já não dá pra nada, imagine sem ele, o que vai ser?
- Não consigo arranjar emprego em canto nenhum!
De súbito, a mãe se levanta e diz:
- Vou tirar minha filha daqui, porque ela está sofrendo muita perseguição. Não aguento mais esta escola.
E sai dali sem se despedir... Como se quisesse chutar a vida pela frente.
Cida Maia, 5 de agosto de 2011
Baixaria
A diretora da Escola Costinha do Brejo , situada num bairro muito populoso de São Paulo, após tomar conhecimento da problemática de uma aluna, chama um funcionário e determina:
- Cinqüenta e Um , por favor, vá até a sala 12 e convide Algodão Doce a comparecer aqui, pois esta menina anda brincando demais e vai muito mal nos estudos.
Cinquenta e Um meneou a cabeça como sinal de aprovação e foi cumprir o solicitado. Retirou-se do lugar onde estava e correu até a sala de jogos, para procurá-la, pois era hora do intervalo.
Subiu as escadarias, daquele imenso prédio , correndo pelo longo corredor,meio ofegante, alcançou a sala.
Parou diante do vitrô e observou se a jovem que estava entre os colegas , jogando xadrez , era ela . Reparou em todos e a reconheceu. Acenou com a mão pelo vão da persiana da janela, apontando com o dedo indicador , a um colega, que estava próximo, para chamá-la.
Assim que ela percebeu , passados uns minutos , veio atendê-lo e ele lhe transmitiu o recado: - A diretora Capuco está chamando você lá na secretaria .
Algodão Doce titubeou, mas desceu a escadaria , tremendo de medo , em direção à secretaria, passou pelo corredor e, aproximando-se da entrada , adentrou a sala principal, lentamente....sem pedir licença.
Dona Capuco, mal avistou a adolescente , foi logo soltando o verbo e pronunciou:
- Algodão Doce, se continuar dessa forma, você perderá a bolsa cidadã e eu não vou poder dar jeito. O PIB vai ficar no saco furado.
-Vou precisar de que sua mãe venha aqui na escola, para justificar o motivo de tanta falta. Só na aula de Ciências você levou 47 ,na aula de Português já somam 56, assim não vai dar certo.Seu aprendizado está muito prejudicado.Você só tem notas vermelhas.
- Não quero que aconteça isto, se não parar, terei de encaminhar seu caso ao Conselho Tutelar. E seus pais deverão ser responsabilizados.
Algodão Doce rebateu: - “Não, não Dona Caputo, não denuncie meus pais , eu vou melhorar, prometo que vou parar de faltar...
Continuou Dona Caputo:
- Cinquenta e Um , pegue este número aqui da ficha , ligue, por gentileza, para mãe de Algodão e peça para ela comparecer aqui na EMEF, o mais breve possível.
Imediatamente ,Cinquenta e Um obedeceu às ordens da gestora , pegou o telefone para discar o número indicado. Discou, ouviu o sinal começar a tocar e aguardou alguém atender o telefone .
Minutos após....
- Alô!
- Alô, quem é?
-Aqui é da EMEF Costinha do Brejo, posso falar com a Dona Sapopemba?
- “Diga lá, sou eu, o que manda?
- A senhora é a mãe de Algodão?
- Sim!
- Boa tarde, Aqui é o inspetor 51, da EMEF Costinha, a direção mandou comunicar a senhora sobre a necessidade do seu comparecimento urgente aqui .
- E o que é?
- Nada mais, nada menos sobre o que sua filha vem aprontando!
- Aprontando ? O quê!!!
- Lá vem chumbo grosso!
Tá bom, daqui a uma hora, terei que ir ao mercado comprar um pacote de arroz e darei uma passadinha aí. (Já vem essa escola me chamar à atenção de nooooovo!) Ai, Ai, Ai...
Como o intervalo tinha acabado, Algodão Doce foi conduzida à sala de aula, ciente de que teria um dia cheio de comentários a seu respeito, e cheio de ”lenga lenga,” com a posterior vinda da mãe.
- Por volta de 15 horas, o dia era muito ensolarado, Dona Sapopemba saiu de casa , querendo logo resolver o caso.
Após passar no supermercado e comprar o pacote de arroz, correu apressadamente , em direção ao local , pois ficava na circunvizinhança de sua casa.
Chegou à escola toda espaventada, transpirando pelas ventas, com o coração quase saindo pela boca.
Entrou pelo portão da EMEF, sem pausa para respirar...
Ao parar diante da secretaria , se identificou , falou que tivera recebido um telefonema, contou o caso e pediu para falar com a diretora.
A ATE foi comunicar à diretora que Dona Sapopemba estava presente, porém não a encontrou e passou todo o problema a Dona Tribufu , a outra Assistente, a qual se encarregou de verificar o caso e de conversar com a mãe.
Dona Tribufu mandou a auxilar pedir àquela senhora que entrasse na sala dela com o intuito de expor toda a situação.
Dona Sapopemba aceitou o convite e foi ao encontro da Assistente de direção. Mal entrou na diretoria , começou a gritar, dizendo que não tinha culpa de nada, que a culpa era dos empregados da Prefeitura que não sabiam trabalhar direito.Fez o maior escarcéu.
Tribufu tentou acalmar o ânimo acirrado da mulher e ofereceu-lhe uma cadeira. Ela aceitou, sentou-se e , após se acomodar, a gestora começou a narração :
- Dona Sapopemba, a sua filha esta abarrotada de faltas, será que não é por causa desse namorado que ela arranjou? Pois ela tem faltado demais na escola , e muita gente tem encontrado os dois juntos perambulando por aí... Muitos já a pegaram atrás do paredão no escuro, namorando.
- Até cheiro de bebida alcoólica, os professores já sentiram em sua filha!
Sapopemba respondeu grosseiramente:
- Olha , o que você está falando? Tá pensando o quê da vida ? Minha filha arrumou um homem bom , um homem que ajuda. Ele bebe , mas dá dinheiro!
Vocês ficam comentando sobre ela, vocês estão com inveja dela. Um homem como ele ,não é pra qualquer uma,não, só faltava esta história, agora, colocar a culpa no namoro da Algodão .Vocês são mal amadas.
Tribufu ficou perplexa diante da atitude da mulher e insistiu :
- Quantos anos tem o namorado de sua filha de 13 anos?
Respondeu Sapopemba:
- Ele tem 23 anos, e daí? Ninguém tem nada a ver com isso.
Indagou a direção:
-Então, senhora, qual o motivo das ausências de sua filha?
Afirmou a mãe:
- Assaduras nas partes de baixo, a menina estava toda ardida nas partes íntimas, como poderia vir à escola?
Insistiu a servidora pública:
- A senhora a levou ao médico?
Disse a mãe:
- Não.
A Assistente quis saber:
-Por quê?
Dona Sapopemba respondeu:
- Porque ninguém gosta de mostrar para os outros as suas vergonhas doentes , pra ninguém , ouviu?
- Minha filha estava sofrendo tanto , que não podia dar, sequer ,um passo, de tanto que as virilhas queimavam e ardiam , era muita dor!
- Agora que veio melhorar , depois que arrumou dinheiro e comprou pomada.
Ainda declarou a mãe:
- Quero pedir uma coisa : - Deixem de perguntar sobre a vida dos outros e ajudem mais a comunidade , senão quem vai quebrar o barraco sou eu e denunciar a senhora de ter causado situação vexatória contra minha menina.
- Esse benefício é o único que nós recebemos para comprar a cesta básica e já não dá pra nada, imagine sem ele, o que vai ser?
- Não consigo arranjar emprego em canto nenhum!
De súbito, a mãe se levanta e diz:
- Vou tirar minha filha daqui, porque ela está sofrendo muita perseguição. Não aguento mais esta escola.
E sai dali sem se despedir... Como se quisesse chutar a vida pela frente.
Cida Maia, 5 de agosto de 2011