A Primeira Missa
Hoje fiz minha primeira viagem no tempo!
Estava no Largo da Carioca quando, de repente, fui tragado pela máquina do tempo e, sem mesmo desejar, fui levado ao século XVI, mais precisamente ao futuro Estado da Bahia, no momento em que era rezada a Primeira Missa na Ilha de Vera Cruz.
Tenho o costume de transitar pelo Largo da Carioca na hora do almoço e ver um sem-número de pessoas ganhando seu pão de cada dia: mágicos e tiradores de sorte; músicos que tocam Beatles, vestidos de índios e com flautas de pan; os “sombras” perseguindo transeuntes distraídos, imitando seu andar e seus mínimos gestos; capoeiristas e engolidores de fogo; uma multidão de vendedores ambulantes; violonistas e guitarristas se apresentando embaixo de barracas para comercializar seus CDs; aleijadinhos fazendo “embaixadinhas” com os mais diversos objetos de formas esféricas; senhoras e meninos pedindo esmolas; e pregadores das mais variadas religiões.
Engraçado! O público é grande onde há diversão e mínimo onde há pregação!
Os pobres pregadores, com seus paletós surrados e bíblias herdadas, batalham incompreendidos e solitários, pela proteção do rebanho, mas as ovelhas se esquivam. Passam ao largo, fingindo não ouvir os chamamentos. São tantos os Ministros e com personalidades tão diversas que, ao menos um, era de se esperar, deveria se enquadrar no perfil daqueles transeuntes, conquistando-lhes alguma simpatia. Mas, curiosamente, não é assim que ocorre. Pelo menos não no Largo da Carioca, na hora do almoço.
Uns gritam, outros falam baixo. Uns leem, outros dramatizam. Uns ameaçam os desgarrados com o fogo dos infernos, outros lhes dirigem palavras de conforto e consolo. A única unanimidade entre eles é que, todos, sem exceção alguma, não têm absolutamente público nenhum!
Mas hoje, curiosamente, um aglomerado de gente chamou minha atenção. Não era mágica, música, nem nenhum espetáculo atlético-circense. Havia um jovem, de não mais do que 25 anos, de bermuda nova e blusa de malha fina, cabelos muito bem cortados, barba feita e sandálias do tipo “turista europeu”. Segurava um microfone na mão direita e, com um pincel na esquerda, pintava figuras coloridas em uma tela de pano, ao mesmo tempo em que falava sobre Deus e suas relações com os seres humanos.
Detalhe: em inglês! Yes! In English! Tá bom, é verdade que ao seu lado havia um auxiliar que, com outro microfone, fazia a tradução simultânea.
Resultado: sucesso absoluto de público e pulverização imediata dos índices de popularidade dos nossos pobres pregadores tupiniquins que, apenas o viam e ouviam de longe e, pelos seus olhares, que Deus os perdoassem, excomungavam o gringo.
Nesse exato momento me senti ausente dali! Estava sendo tragado pela máquina do tempo! Acabei desembarcando na cena da Primeira Missa, na Ilha de Vera Cruz! Desembarquei e permaneci escondido atrás de uma grande árvore de caule vermelho e graciosas (e miúdas) folhas verdes. Casa cheia! No mínimo duas, talvez três centenas de pessoas!
De um lado, com as costas voltadas para a floresta, muitos cidadãos e cidadãs, velhos, jovens e crianças, todos nus ou seminus. Do outro lado, de costas para o oceano, lá estava outro tipo de gente: apesar dos pelos em torno da boca e queixo, eram bonitos, saudáveis, dentes em bom estado e, estranhamente, não andavam nus. Ao contrário, tinham vestes ricamente adornadas e muito coloridas, lembrando as cores das penas das araras e pavões, tão conhecidas e desejadas por ali. Tinham chapéus, como grandes bolos de mandioca, com uma textura inusitada e colorido bizarro. Tinham colares, adornos e grandes objetos brilhantes, com os quais facilmente abriam caminho na mata. Ao fundo, se viam suas canoas gigantes, com imensos panos pintados, agora recolhidos ao longo do mastro.
Os nativos pareciam entender que aqueles estranhos tinham também os seus pajés, pois esses, além de vestirem-se de forma diferente, carregavam estranhas esculturas de madeira e falavam muito mais (e mais alto) que os demais, que sempre permaneciam em silêncio para ouví-los.
Pois bem, lá estavam os índios extasiados e atentos a todo aquele latim! Não vi nenhum tradutor e não me lembro de ter visto alguém ensinando latim aos índios. Acho (poderia apostar minha viagem de volta ao século XXI) que ninguém estava entendendo nada! Mas eles estavam lá! Não arredavam pé! Muito atentos e até, posso garantir, participativos. Ajoelhavam-se e levantavam-se. Benziam-se e erguiam as mãos a Tupã. Arriscavam algumas palavras e cantos.
Bons rapazes aqueles brasileiros.
Ôpa! ...Está acontecendo algo! ...Ah sim! Voltei ao Largo da Carioca!
Voltei pensando: será que os pajés indígenas conseguiram, alguma vez, juntar tantos índios? Não fui à aldeia, mas posso garantir que não ficou nenhum por lá! Nem os doentes! Será que “santo de casa não faz milagre” desde 1500? Será que o barato é mesmo o “show business”? Será que o “reino” da novidade “bem embrulhadinha” é tão determinante e poderoso assim?
Olhei pro gringo e lá estavam: ele, seu tradutor, suas pinturas e seu enorme rebanho!
Perdido em meus pensamentos resolvi atender aos apelos de meu estômago e ir almoçar. Hoje, em um lugar diferente! Bem transadinho, com uma mesa bem adornada, uma vista bem legal, boa decoração, um cardápio original e, de preferência, com comidas que eu desconheça.
Fui a um tailandês!
Comida estranha!
Não sei explicar o gosto mas...
Engraçado... gostei!