Eu queria...
Eis que sem saber o porquê, retorno a esse cantinho para dividir reflexões.
Queria eu escrever agora o texto mais lindo do mundo. Que inveja eu tenho daqueles que conseguem escrever os textos mais lindos do mundo.
Deixar escorrer toda a tristeza para o papel. Fazer com que alguém leia, e pegue essa tristeza, tirando-a um pouco de mim.
Que inveja eu tenho daqueles que já vivem lá na frente.
Daqueles que vivem lá no futuro, naquela linha do tempo tão oposta.
Naquela linha do tempo tão não linha.
Queria eu viver no lá, ao invés de no aqui.
O aqui é muito chato e curto. Só dura daqui até ali.
Queria eu tirar de dentro esse amargo.
Fácil como tirei os meus anéis.
Que inveja tenho eu das pessoas que são livres de sentimentos. Eu me sinto condenada.
Queria eu ser um copo de whisky. E ser bebida com prazer. E acabar junto à última gota.
Mas não. A última gota foi bebida, o gelo derreteu e eu continuo aqui.
Não acabei. Só acabaram comigo, mas eu, não acabei.
Que inveja eu tenho das pessoas em fotografias.
Tenho inveja daquela eu que está sorrindo, numa festa junina aos 7 anos.
Ou daquela outra eu, de vestidinho preto... estava leve, e com cabelos longos, escuros, aquela eu tão desprendida...
Queria eu ser alguém de fotografia.
Para sempre, irritantemente feliz.
Eu queria mesmo era pular agora. Como criança. Tentando alcançar o mais alto possível.
Mas sou pesada. Estou ficando velha.
Como eu queria um belo e suculento beijo cheio de desejo.
Todo o resto parece me fazer salivar.
A louça suja. Quem me dera ser uma louça suja.
Ficar ali, suja de prazer, até que alguém venha e me tire da sujeira, sem eu precisar me preocupar. E vai me tratar bem para que eu não quebre.
Também invejo minhas palavras digitadas. Que nascem fazendo sentido e interagindo com várias outras que só as dão ainda mais sentido.
Vida fácil essa das minhas palavras. Invejo as palavras.
Engraçada essa vida.
Essa trama amassada, enlaçada.
Queria eu ser o computador.
Ter um monte de gente viciada em mim. E ao final dessas linhas, ter também um botão de “desliga”, para só ser ligada amanhã.
E só.